Amber #125 - Suspicious minds (2)

7 de dezembro de 1939
9h10

“Uau. Essas empregadas do velho Cheng são bem caprichosas!”, disse Huang, se sentando na mesa na sala de jantar da mansão de Cheng, “Hora de matar o que tá me matando! Que fome do caralho!”

“Sempre folgado, hein Huang? Pelo menos tenha modos, por favor”, disse Ho, se sentando na mesa vendo Huang se servindo.

“Falou, mamãe! Ho, você como sempre fica me tratando como filho, não muda nada”, disse Huang, provocando Ho.

Nesse momento Tsai apareceu com Schultz, e os dois cumprimentaram acenando com a cabeça, e soltando um “Da-jia hao” (“bom dia” em chinês). Ho soltou um cumprimento mais empolgado, enquanto Huang soltou um mais rabugento, fingindo não reparar nos dois juntinhos. Ao se aproximar da mesa, Tsai enlaçou seu braço com o de Schultz e o acariciou com a outra mão, antes de retribuir o “bom dia” que lhe deram.

“Sente-se aí, Schultz. Vou comer rapidinho que hoje tenho muita coisa para fazer. Você pode ficar aqui e comer a vontade, tudo bem?”, disse Tsai, e Schultz confirmou com a cabeça.

“Tudo bem! Sem problemas”, disse Schultz, vendo que uma das empregadas traziam uma tigela cheia de baozi quentinhos saídos do vapor, “Minha nossa, baozi fresquinhos! Faz tempo que não como esses bolinhos, ahhh!”.

E Tsai sorriu olhando para Schultz. Huang obviamente sabia, mas nesse momento se Ho tinha alguma dúvida, essa se foi por terra ao ver o sorriso da Gongzhu. A Gongzhu dificilmente sorria, mas ela deu um sorriso muito fácil. Mas não era um sorriso comum. Como mulher, e bem mais velha, Ho sabia exatamente o que era aquilo: era o sorriso de uma mulher apaixonada.

“É, parece que esse Chang Ching-chong vai dar uma festa de gala num prédio perto da Cidade Proibida nessa noite”, disse Cheng, aparecendo do nada, e lançando uma folha de jornal na mesa, “Não cita em específico o nome dele, mas minhas fontes confirmaram que ele estará lá. Parece que é um antigo Senhor da Guerra ricaço que promoveu essa festa”.

“Uau. O senhor tem uma rede de informações realmente impressionante”, disse Tsai, chocada, “Pequim realmente está na palma das suas mãos, senhor Cheng”.

“Como você pretende adentrar esse local?”, disse Cheng, ignorando completamente o elogio que Tsai lhe deu, “Pelo que vocês me adiantaram, Chang Ching-chong está por detrás de um coreano que se infiltrou como seu informante e te traiu, é isso?”.

“Sim, temos algumas perguntas para fazer a ele”, disse Tsai, falando com Cheng e voltando o olhar para o jornal, “Acho que faremos o óbvio mesmo. Invadir sorrateiramente”.

Cheng nessa hora olhou com desprezo para Tsai depois de ouvir o plano inicial da chinesa.

“Pft! Faça-me o favor! Numa festa de gala com centenas de pessoas? Isso é extremamente arriscado, Tsai. Se vocês forem pegos, não terão uma segunda chance”.

“E o que o senhor sugere?”, perguntou Tsai.

“Que tal se entrássemos na festa como convidados?”, sugeriu Schultz.

“Rá, que piada… Isso nunca vai dar certo, alemão”, disse Huang, dando risada. Mas logo se viu dando risada sozinho.

“Era exatamente o que eu estava pensando”, disse o velho Cheng, e nessa hora Huang engoliu o riso, sem saber onde enfiar a cara, “Terão guardas espalhados por todo o local, e eles estarão esperando uma invasão. Mas se você entrar disfarçada de convidada da festa com outros, será mais seguro e eficiente”.

“A nossa opção óbvia seria invadir o prédio, mas eles estão esperando isso. Se entrarmos como convidados da festa, mesmo que estejamos por debaixo do nariz deles, dificilmente eles vão nos perceber”, disse Ho.

“Tudo bem, faz sentido, senhor Cheng. Temos que nos preparar então”, disse Tsai.

“Cuide da logística, divida as tarefas, e deixa o resto comigo”, disse Cheng, saindo da mesa, “Afinal, com que roupa você está pensando ir?”.

Tsai nessa hora fez uma cara consternada. Obviamente ela não tinha roupas de gala para usar naquela noite.

“Esse silêncio me diz tudo. Vou mandar buscarem roupas, cabelo e maquiagem para vocês. Esse disfarce tem que funcionar, e isso significa que vocês devem estar no mínimo deslumbrantes para essa festa de gala”, disse Cheng, chamando algumas empregadas enquanto saía da mesa do café da manhã.

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11h02

“De acordo com o que o Cheng levantou, essa festa vai atrair todos os ricões e pessoas influentes do Japão e da China”, disse Schultz, jogando a pasta no meio da mesa, “Uma festa de gala, bem no estilo ocidental. Uma forma de mostrar poder. Afinal a China está cada vez mais se rendendo e se tornando parte do Império Japonês. Uma reunião de amizade e para fortalecer os laços do que domina com o dominado”.

“E poder sempre vem junto com muito dinheiro”, disse Huang, na mesa reunido com Tsai, Ho e Schultz, “Ideologias nesse caso são o de menos. O que importa é se mantiverem os negócios protegidos”.

“E quem vai ficar com o Saldaña aqui?”, perguntou Ho.

“Vamos deixar com o Cheng. Ele pelo visto deve detestar americanos. Acho que podemos garantir que ele vai tratá-lo bem”, disse Tsai, e nesse momento Schultz deu uma risadinha irônica.

“Haha… Queria estar aqui pra ver isso”, brincou Schultz.

“Schultz e eu vamos nos infiltrar como convidados da festa. Cheng conseguiu para nós um convite com nomes falsos. Eu serei uma donzela japonesa natural da cidade de Nara, chamada Hiroko Kawada. E o Schultz será meu marido, um fuzileiro naval inglês da reserva, George Croasdell”, disse Tsai.

Huang virou o rosto pro lado, demonstrando desdém ao ouvir isso. Tsai fingiu que não viu.

“Puxa, um casal? Será que não levantaria suspeitas?”, perguntou Ho.

“Hunf, suspeitas? Fala sério…”, disse Huang, sem gostar nada do que haviam planejado, “Parece provocação, essa merda”.

Huang bufou e se ergueu da mesa. Tsai e Schultz tentaram manter a compostura, apesar da atitude de Huang. Continuaram falando plano, mesmo com Huang deixando a mesa:

“Falaremos apenas em inglês. Falarei com um sotaque japonês para deixar menos suspeito”, disse Tsai, e nessa hora ela elevou um pouco a voz na direção de Huang, que já estava deixando a sala de jantar: “E Huang, preciso que você se infiltre na festa, será que você consegue? Preciso de uma pessoa incógnita para ficar de olho em tudo”.

Mas Huang já havia virado, deixando apenas um aceno com a mão para Tsai, confirmando que havia ouvido tudo.

“Gongzhu, sei que não é do meu feitio perguntar isso, mas…”, disse Ho, fazendo uma pausa e olhando para Schultz e Tsai, “Por acaso vocês dois estão juntos?”.

“Nossa, Ho… Que pergunta”, disse Tsai, olhando para Schultz, que tomou a frente para explicar:

“Estamos juntos, sim, se quer saber Ho. Eu gosto muito da Tsai, e acho que é recíproco. Mas estamos no começo, estamos, vamos dizer, curtindo”, disse Schultz, colocando sua mão carinhosamente sobre a de Tsai, na mesa. Ela ficou com o rosto vermelho ao sentir a pesada mão de Schultz sob a sua, “Mas não temos nada a esconder. Existe sim um sentimento entre a gente”.

Tsai então sentou ao lado de Schultz, e olhou firmemente para Ho.

“Ho, eu queria te pedir um favor. Huang está muito abalado com tudo isso, é uma situação muito difícil para ele. Infelizmente ele está com o coração quebrado”.

“Entendi. Mas Gongzhu, eu sou casada, e meu marido não gostaria nem um pouco que eu fosse consolar o Huang. Sem contar que ele não faz muito o meu tipo”.

“Não, não! Não é nada disso. Eu me preocupo com ele, e sei que ele não é lá o melhor amigo de você, mas gostaria que você tentasse dar uma força para ele entender. Especialmente que as coisas entre eu e ele acabaram. Eu não gosto de vê-lo sofrer assim. É muito triste quando uma pessoa sofre por amor”.

“Tudo bem, Gongzhu. Acho que pelo bem do nosso pelotão, e de nossa própria sanidade, seria bom dar uma força para o Huang. E quanto a mim, eu ficarei no lado de fora mesmo?”.

“Sim. Eu preciso que você se disfarce como uma pessoa de rua. A China está muito pobre, e muitas pessoas estão passando fome e necessidade nas ruas. Uma mendiga sem dúvida conseguiria passar sem levantar muitas suspeitas”.

Ho ergueu o polegar confirmando e deu um sorriso para a Gongzhu.

“Nós entramos em contato com vocês no meio da festa. Qualquer atividade suspeita, não se esqueça de nos reportar”, disse Tsai, finalizando.

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