Amber #29 - Uma arma chamada esperança.

“Liesl, você tá legal?”, perguntou Schultz. Liesl estava apavorada vendo aquilo.

“Schultz… O que diabos é isso?”, perguntou Liesl, vendo o ser que cuspia fogo.

O ser de escamas escuras apontou a turbina no braço direito e um som muito forte começou a ser emitido enquanto as hélices de dentro giravam. A mira era claramente Liesl e Schultz.

“Puta que o pariu, vai atirar!!”, disse Schultz carregando Liesl nos braços, correndo até um monte de escombros que estavam ali perto. Enquanto Schultz corria era possível sentir atrás dele uma potente labareda, mais alta que ele, parecendo um redemoinho de fogo, mas horizontal. Os dois conseguiram se proteger e continuaram correndo dali.

“Liesl, eu vou ficar e lutar! Preciso que você vá atrás da sua prima! Não os deixem levar a Maggie de forma alguma!!”, gritou Schultz. Liesl estava tomada pela adrenalina, e já no chão, depois de sair do colo de Schultz, estava pronta pra ir, “Contorne esses escombros, tente achar uma maneira que eles não te achem, tudo bem? Eu já estou indo, logo atrás de você!”.

“Tudo bem!”, gritou Liesl, “Pode deixar comigo, senhor Schultz! Por favor, me tome cuidado enquanto estou indo pra lá!”.

Liesl começou a correr, e Schultz se virou. O jeito era pensar numa melhor abordagem daquele monstro que cuspia fogo. Com sua Browning HP em punhos foi caminhando em passos rápidos até de volta no local onde estava aquele monstro estranho. As redondezas do local ainda ardiam em chamas, queimando a madeira e outros materiais inflamáveis que haviam sobrevivido entre os escombros de Guernica. Mas chegando lá, o ser não estava lá.

Mas que merda! Será que aquele treco foi atrás da Liesl?!, pensou Schultz.

Mas mal ele teve tempo pra concluir o pensamento e se virar quando dois ciclones de chamas apareceram na sua frente, se desenhando no chão e se aproximando dele.

Ah, deus! De onde essa merda está vindo?!, tentou pensar Schultz, e ele reparou que aqueles dois ciclones não vinham em sua direção como o outro. Eram verticais, vindos de cima! Quando Schultz virou o rosto pra cima viu que aquele ser estava com asas, com uma envergadura imensa das asas, planando acima dele.

“Caralho! Isso só pode ser brincadeira! Essa porra voa também?”, disse Schultz ao ver que além de cuspir fogo, aquele ser voava. As chamas estavam se aproximando ferozmente dele, e com certeza ali seria o seu fim. Schultz estava encurralado em escombros em chamas ao seu redor e não havia muito para onde correr.

Mas quando os ciclones de chamas vieram até sua direção do nada se abriram na frente e passaram os dois do seu lado. Era algo inacreditável aquilo tudo. Ao mesmo tempo que as chamas irradiavam beleza e brilho, aquele som ensurdecedor de turbina causava um pânico interno imenso.

Hã? Não me queimou?, pensou Schultz ao ver os ciclones passando pelo seu lado. Logo depois disso o ser das escamas escuras pousou no topo de uma parede - um resquício do que sobrou do que era um edifício, e de lá ficou observando Schultz.

“Que bosta! Então você não veio me matar, agora saquei!”, gritou Schultz, “Você fez isso de propósito pra ganhar tempo pro Raines fugir com a Maggie! Filho duma puta esperto!”.

Schultz pegou sua arma e começou a disparar, mas as balas simplesmente ricocheteavam na armadura. No quarto disparo a bala foi mirada bem numa das juntas da armadura, e lá acertou o que estava por debaixo da armadura.

O monstro então soltou um grito. Sua voz era fina. Schultz achou isso muito estranho, mas pelo menos algo havia transpassado aquela carapaça dura.

“Rá!”, disse Schultz, comemorando o êxito do disparo, “Então você sangra, sua aberração!”,

Logo depois disso o ser com escamas negras abriu as asas. Aquilo era imenso. E as turbinas nas pernas e nas mãos foram ligadas, impulsionando-o no ar. Ele estava fugindo.

Já Schultz estava no chão, suando, roupas meio rasgadas por conta da proximidade do fogo, pele com algumas leves queimaduras, e as partes descobertas da sua pele estavam vermelhas como pimentão. Por mais que estivesse longe das chamas, ele quase virou churrasco, sem nem ser atingido diretamente por elas.

Realmente foi por muito pouco que algo pior não aconteceu.

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Liesl estava com um misto de esperança e medo. Não sabia quem eram aqueles homens. Sua prima nunca havia lhe contado nada sobre as coisas que ela mexia. Mas não conseguia deixar de temer pela vida da sua amada prima. Ela havia sido duramente espancada, e estava claramente sem forças, com o rosto todo ensanguentado, sendo levada como um animal pelos braços, arrastada no chão, por dois homens.

A sorte é que as marcas dos pés ficaram bem visíveis, e não foi difícil pra Liesl Pfeiffer encontra-los.

“Você me paga, sua vagabunda!”, disse Raines pra Maggie.

Liesl os encontrou na entrada de um galpão velho, já distante do alvo do bombardeio da Legião Condor. Embora estivesse de pé, dava pra perceber as rachaduras nas paredes por terem sofrido com as ondas de impacto das explosões ali próximas. Não haviam muitos soldados, só os dois que carregavam Maggie e mais Oliver Raines, que parou na entrada e, tomado pela fúria, começou a agredir ainda mais Maggie Braun.

“É o fim do jogo pra você, Raines. Eu devia ter me lembrado do seu rosto! Vai acabar tudo agora! Seus planos idiotas irão pro espaço, seu imbecil!”, disse Maggie, lutando contra as dores e os hematomas pra falar.

“Mortos não falam! E assim que eu matar aquela outra pretinha, tudo estará acabado!”, disse Raines, “Até o lendário Roland Briegel vai vir comer aqui, na palma da minha mão!”, Oliver Raines apontou pra palma da sua mão, gesticulando.

E depois disso ele desferiu três potentes socos em Maggie Braun. No primeiro soco Liesl sentiu um enorme aperto no coração. Aquela mulher era a única família dela e estava sendo morta ali na sua frente! E se ela ficasse sem ela, pra onde iria? Era uma pessoa sem pátria, e se morresse como uma desconhecida em alguma vala? Se sobrevivesse, seria obrigada a se prostituir? Entrar pro crime?

No segundo soco Liesl se perguntou porque o mundo era tão cruel? Ela era meio judia e meio alemã, não havia nascido assim. Ela era a prova de que a Alemanha era um país onde arianos e judeus conviviam em paz, até mesmo se amavam! Por acaso ela era a errada nessa história por ter nascido? Todos são seres humanos, independente das suas raças, todos têm direito à vida!

E no terceiro soco Liesl ouviu o grito de Maggie, já quase perdendo os sentidos. Ver a cena abalou Liesl em seu coração, doendo tanto nela do que havia doído na sua prima. E Liesl viu que as coisas não estavam perdidas. Não ainda! Sua prima poderia ser salva, nem que ela tivesse que se sacrificar para isso! Pior que viver sem a presença da prima que tanto amou seria viver sem ela! O terceiro soco lhe deu… Coragem!

“Solta minha prima agora, seu canalha, covarde e asqueroso!”, gritou Liesl pra Raines, que estava pronto pra desferir mais um soco.

“Liesl?!”, gritou Maggie ao ver sua prima, “Saia já daqui agora, você vai morrer!”.

Raines ergueu a mão pra Maggie, gesticulando pra ela parar de falar. Raines pegou sua pistola e a desengatilhou.

“Você é a prima dela. Sim, você era a que estava lá atrás, gritando igual uma pentelha”, disse Raines, apontando a arma pra Liesl, “Você não tem arma. Só tem um par de olhos lacrimejando de raiva. Qual é a sua arma, menininha?”.

“Minha arma?”, gritou Liesl, “Eu não tenho nenhuma arma aqui comigo. Mas eu acredito na esperança! E a esperança que tenho depositada no senhor Schultz e no coronel Briegel é inabalável, e sei que eles estarão aqui e vão me ajudar!!”.

Oliver Raines deu um sorriso. No fundo não entendeu se aquele discurso da menina era tirado de algum filme brega, ou se a menina era realmente sem noção do perigo. Era claro que Liesl iria morrer ali na frente de Maggie Braun.

“Crianças são seres bem puros mesmo”, disse Raines, mirando em Liesl, “Vou levar essa sua pureza comigo no novo mundo que irei construir. Um mundo onde todos teremos esperanças”.

E um disparo ecoou. Pássaros passaram voando por ali, assustados. Gotas de sangue tingiam aquele solo castigado pelo sol de Guernica.

“Impossível!”, gritou Raines, e depois soltou um urro de dor, derrubando a arma e colocando as mãos na perna que havia sofrido o disparo.

“Liesl, no fundo a sua arma sempre foi a que definiria quem seria o vencedor!”, disse uma voz atrás dela, “E pode ter certeza que tentarei corresponder à sua esperança depositava em mim e no coronel com toda minha alma!”.

Atrás de Liesl Pfeiffer estava Schultz, arfando, depois de ter corrido igual um louco depois da batalha contra o ser que cuspia fogo.

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