Amber #93 - EXTRAÇÃO.
Chen estava já na frente, armando pequenos explosivos na porta da casa de Chou Xuefeng. Schultz foi na frente, e o viu lá. Ele mal havia conversado com ele, e não sabia lidar com ele pelo fato dele ser surdo. Por um momento preferiu evitar um eventual contato, mas bem na hora que ele estava indo se virar para dar meia volta, Chen se virou e os dois se viram.
De início Schultz ficou meio desconcertado. Os dois ficaram se encarando e um gelo imenso surgiu entre os dois ali, a poucos metros de distância, em silêncio e sem graça, encarando um ao outro naquela rua deserta e escura à noite. Sem saber como reagir, Schultz ficou parado. Mas Chen, mais maduro, deu um pequeno sorriso pra Schultz e se virou pra continuar seu serviço.
Schultz viu então que aquilo tudo era besteira, e se aproximou de Chen. Aquele sorriso era sinal de que ele bem mais simpático do que imaginava. Ao se aproximar de Chen, Schultz se agachou do seu lado e começou a ajuda-lo. Quando Chen percebeu que Schultz estava lá do seu lado foi a vez de Schultz dar um sorriso simpático para o chinês que ele praticamente desconhecia.
“Acho que a gente nunca chegou a conversar muito, né?”, disse Schultz, tomando cuidado para não falar alto. Chen não havia se virado para Schultz, logo fez cara de quem não entendeu, e fez um gesto para que ele repetisse, e alemão repetiu a mesma coisa, gesticulando bastante e abrindo bem a boca, para que Chen eventualmente pudesse compreender, mas ainda manteve o tom baixo para não denunciar seu local para Chou Zuefeng ou os militares japoneses dos arredores.
“É verdade. Mas não pense que eu sou antipático. Apenas sou uma pessoa mais introspectiva”, disse Chen, e Schultz ficou surpreso! Era uma das poucas vezes que ele havia ouvido a voz de Chen, que era bem grave. Uma voz que contrastava com sua aparência frágil e baixa estatura. Ainda surpreso em estar trocando palavras com o chinês, Schultz não sabia o que responder. Foi Chen que prosseguiu: “A minha esposa já fala bastante por nós dois, haha. Então eu prefiro não incomodar. Sou uma pessoa um bocado tímida também”.
“Tímido? Nossa, não parece. A gente nem teve como conversar, e esqueço que você não é totalmente surdo. Acho que no fundo é um preconceito besta que eu tenho, você entende perfeitamente o que digo”, disse Schultz, da mesma maneira que antes, gesticulando e abrindo bem a boca pra falar para ajudar Chen a entende-lo melhor. De fato funcionou, pois Chen sequer pediu pra ele repetir.
“Eu sou bom em leitura labial. Eu meio que sempre fui antes, eu era quase que um espião pra decifrar conversas de longe, usando binóculo, apenas fazendo leitura labial para a Gongzhu. Não precisa gesticular tanto, senhor Schultz. Consigo entender mesmo se você fizer um movimento mínimo de lábios”, disse Chen, dando uma piscadinha. Schultz então se surpreendeu. Pensava que Chen era uma pessoa perdida no grupo, uma pessoa que não falava muito e ouvia nada. Uma pessoa que apenas servia para explodir as coisas e só. Mas no fundo Chen sabia exatamente tudo o que estava acontecendo ao seu redor, mesmo que não conseguisse ouvir com os ouvidos. Ele ouvia com os olhos, por meio de uma leitura labial avançadíssima.
“Cara, incrível, mudou completamente o que pensava sobre você, pra melhor. Isso aí é pra quê?”, perguntou Schultz, apontando para os explosivos na porta. Eram pastilhas, não pareciam capazes de grande coisa.
“É uma coisa que criei. Funciona para arrombar portas, mas com explosivos. A explosão é relativamente baixa e apenas estoura a porta, permitindo a gente entrar”, explicou Chen, apontando para as pastilhas explosivas coladas na madeira da porta, perto da fechadura e dos trincos, “O Huang era ótimo com fechaduras, mas infelizmente ele não está aqui. Então vai ser do meu jeito mesmo, a Gongzhu permitiu, apesar do perigo do barulho”.
“Invenção sua?”, disse Schultz, olhando mais de perto as pastilhas, “Você pode ser quietinho, mas é bem inteligente!”.
Chen deu um sorriso para Schultz. Aquela conversa poderia ter sido curta, mas havia quebrado as primeiras impressões que cada um tinha do outro. Schultz imaginava Chen um antissocial, mas ele era apenas uma pessoa mais introspectiva, e incrivelmente inteligente. Já Chen achava Schultz um antipático, mas se surpreendeu ao ver que o alemão era uma pessoa muito melhor que ele poderia imaginar.
“Estou só no aguardo da ordem da Gongzhu. Ela já está vindo?”, perguntou Chen.
“Na verdade ainda não, ela está combinando as coisas com a Eunmi, Li, Chou, etc. Eu vim aqui apenas ver como estava o andamento das coisas que você tá fazendo, mas vou voltar lá e ver como está a situação! Com licença, Chen”, disse Schultz, se retirando da frente de Chen, que sorrindo novamente, confirmou com a cabeça. Chen era realmente muito simpático e bem mais bacana do que imaginava. O alemão então fez o caminho de volta de poucos metros até onde todas estavam reunidas, e viu Tsai descendo com Ho, enquanto Chou ficava ainda lá em cima, perto de Li que estava com seu rifle de atiradora de elite a postos, observando todo o movimento na rua.
“Vamos, Schultz”, disse Tsai, se aproximando de Schultz, “Vou deixar a Chou de olho no Yamada. E também a postos caso alguém precise de cuidados médicos. Vamos eu, você e a Ho invadir a casa e retirar Chou Xuefeng de lá”, nessa hora Tsai cruzou Schultz e seguiu em direção da casa que iriam invadir ao lado de Ho, enquanto Schultz continuava parado lá as observando. Tsai, ainda caminhando, se virou para Schultz e completou, dizendo o resto do planejamento: “Eunmi vai ficar na rua detrás. Li vai nos dar o suporte como atiradora de elite. Todos nós estaremos ligados nos rádios intercomunicadores no ouvido, deixe o seu ligado também”.
“Sim, princesa! Já estou indo!”, disse Schultz, acelerando o passo indo até Tsai.
“Ei, Schultz!”, disse Li, num tom alto, chamando Schultz lá de cima da casa, “Proteja a Gongzhu, viu! Mesmo que isso signifique sacrificar sua vida!”.
Schultz deu um riso ao ouvir e se virou para Li antes de responder:
“Ah, qual é, menina! Tá parecendo discurso de quem vai morrer em filme! Isso vai ser mais fácil que roubar doce de criança, daqui uns cinco minutos estamos de volta. Vê se fica de olho aí pra nos proteger!”, disse Schultz, voltando a acelerar o passo na direção de Tsai e Ho. Antes de entrar na casa viu Eunmi cruzando o quarteirão do outro lado, e bem nessa hora a coreana se virou e viu Schultz lá, perto da entrada. Ele fez um sinal de positivo com o polegar pra coreana que retribuiu, seguindo seu caminho. Todos estavam a postos.
“Pode arrombar a porta, Chen, por gentileza”, disse Tsai, via rádio. Chen se preparou pegando o gatilho do explosivo, “Lembrem-se: Chou Xuefeng deve ser capturado vivo a qualquer custo. Iniciando extração, agora!”.
E a explosão dilacerou a porta.
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Eunmi, já chegando na saída dos fundos da casa de Chou Xuefeng ouviu no rádio comunicador no seu ouvido a ordem de Tsai para começarem a missão. A explosão foi um pouco mais baixo que um rojão, era difícil pra ela imaginar que aquele barulho era capaz de destroçar uma porta, mas ao mesmo tempo era impossível de passar desapercebido, ainda mais no meio da noite.
Espero que isso não atraia japoneses aqui. Vamos ter sérios problemas se tivermos que proteger esse fotógrafo ao mesmo tempo que entramos em combate com soldados japoneses, pensou Eunmi. Ela esticou o pescoço e viu que não era possível ver o ponto em que Li estava, exceto alguns metros dali. Logo essa saída dos fundos da casa do chinês era um ponto cego para Li, que não tinha como saber se o chinês fugiria por ali.
Ao seu redor Eunmi via algumas casas, e ao prestar mais atenção via que, apesar de estarem as luzes desligadas, era possível ver os olhos brilhando de quem estava espiando de dentro o movimento na rua, refletindo as luzes da iluminação pública. A explosão chamou a atenção da vizinhança, mas o clima em Nanquim não era dos melhores. Pessoas tinham medo. Medo inclusive de espiar.
Eunmi de alguma forma passava mal naquela situação, uma vez que parecia que haviam tantas pessoas a observando. Mas nessas horas ela tentava voltar ao foco da missão. Sua missão era proteger aquele local, e pegar Chou Xuefeng caso ele tentasse fugir.
“Ei, Eunmi-ya! Eunmi-ya!”, disse uma voz masculina atrás dela. Ao se virar viu que a alguns metros dali havia uma pessoa. Ao se aproximar, teve uma péssima surpresa. Era seu primo, Jin-su. Novamente.
“Eu já disse pra me deixar em paz, Jin-su!”, disse Eunmi, impaciente.
“Eunmi-ya, vem aqui, vamos conversar! Desliga esse comunicador, rapidinho, vem!”, disse Jin-su, apontando pro ouvido. Mais tarde, enquanto refletia as consequências dessa escolha, ela relembrou que nesse momento ela não tinha a intenção de dar ouvidos ao que Jin-su queria falar. Deixaria ele falando ali, ou daria algum golpe para apaga-lo. Jin-su, apesar de ser da sua família, havia feito algo que ela jamais conseguiria perdoar. Essa proposta de irem morar no Japão a custo de sua identidade tinha feito ela se sentir profundamente indignada. Ela apenas se aproximou de Jin-su depois que ele, ao ver que ela não chegaria perto dele de forma alguma, disse as seguintes palavras: “Eu te devo desculpas!”.
“Desculpas?”, disse Eunmi, tirando o fone do ouvido e desligando seu comunicador, “Ainda bem que você desistiu dessa loucura de ir morar no Japão e virar japonês!”.
Mas Jin-su baixou a cabeça e balançou negativamente. Eunmi não podia acreditar no que ele falaria a seguir.
“Não, Eunmi, eu não desisti de ir morar no Japão. Eu vim exatamente pedir desculpas por ter sido grosso com você antes, mas não vim pedir desculpas por ter proposto você ir comigo e termos uma nova vida no Japão”
“Eu não acredito! Você ainda insiste nisso?”.
“Eunmi, por favor venha comigo! Larga tudo, deixa eles se virarem aí, eles não te devem nada! De manhã vamos cruzar o mar até o Japão, temos uma casa garantida, um emprego, uma nova vida! Que se explodam essas coisas de honra que você tem, a gente tem é que pensar na nossa sobrevivência em primeiro lugar! A vida real não tem espaço pra sonhos ou utopias!”.
“Eu já te disse que eu não vou, Jin-su! Se quiser ir, vá sozinho! Eu tenho uma missão, faço parte de um grupo que não quer suprimir quem eu sou. Querem me ajudar, e eu quero ajuda-los em troca também! Essas pessoas me inspiram todos os dias para que eu dê meu melhor! Não desperdice seu tempo, nem o meu tempo tentando me convencer de algo que eu jamais aceitarei!”.
Mas nessa hora Jin-su avançou e segurou no braço de Eunmi. Ao olhar sua expressão Eunmi viu que ele não tinha raiva. Até que não estava apertando. Era uma abordagem diferente, mas ao mesmo tempo igual do que ele havia feito. Ela podia ver o clamor nos olhos dele. E talvez por um segundo ela teve dúvida. Será que não seria melhor ir para o Japão e ter uma nova vida lá, do que morrer como uma coreana por ter desafiado o exército japonês que os havia conquistado?
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Tsai, Schultz e Ho entraram na casa. A casa de Chou Xuefeng era pequena e não tinha nenhum andar superior. Em segundos poderia ser completamente vista e checada, então Tsai apontou para Ho e Schultz irem para a cozinha e pra sala, respectivamente, enquanto ela ia direto no quarto dele.
Chen os esperava do lado de fora, prestando atenção no movimento da rua, junto de Li que estava de olho em tudo através do visor do seu rifle de atirador de elite.
Tá tudo calmo. Calmo até demais, disse Schultz enquanto verificava a sala. Tinham algumas fotografias espalhadas em quadros ao redor, mas não era possível descrever com exatidão por conta da escuridão. A parca luz que vinha da janela iluminava muito mal o local, mas ainda assim era possível ver que não havia ninguém lá. O cômodo estava limpo.
Ho também viu que apesar da louça para lavar, tudo parecia bem. Um pouco de comida nas panelas, e ao abrir ela viu que era arroz. Talvez o fotografo era mais do sul da China, onde eles tinham mais o costume do comer arroz, ao contrário do norte que usualmente preferem macarrão. A cozinha era iluminada por um lampião, aparentemente ligado para caso o chinês precisasse pegar algo na cozinha na noite. Mas ao verificar nos cantos, Ho percebeu que o local também estava limpo.
Tsai então entrou no quarto, sem fazer barulho. Caminhando lentamente, viu que a cama estava desarrumada, e era possível distinguir um volume debaixo das cobertas. Fazia frio, era sensato estar tão coberto assim.
“Alvo localizado, ele está aqui. Estou me aproximando”, disse Tsai, via rádio, para todos ouvirem.
Com sua pistola em punhos, a Gongzhu foi se aproximando passo a passo. Colocou a mão no cobertor e sentiu algo estranho nos seus dedos. Não teve muito tempo para pensar. Puxou o cobertor para revelar quem estava debaixo daquilo.
Tsai tomou um susto enorme nesse momento.
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Momentos antes de Tsai entrar no quarto de Chou Xuefeng, Li continuava de olho nos arredores. Estava de noite, e obviamente eles não tinham condições de terem escopos de visão noturna, uma novidade militar da época. Mas ainda assim dificilmente algo escaparia da visão aguçada e treinada de Li.
Na rua da frente era possível ver que não havia nenhum movimento. Estava deserta. Conforme Li ia virando o escopo pra observar toda a extensão da rua, percebeu ao longe um movimento na rua de trás. Por conta da escuridão, era possível ver apenas quando o vulto era iluminado pelas luzes do postes. O que uma pessoa fazia tarde da noite ali?
Ao aproximar o visor do vulto percebera que na verdade não era uma pessoa. Eram duas. Era possível ver que havia uma pessoa atrás de outra, caminhando na calçada, olhando para trás enquanto empurrava a pessoa na frente, que parecia estar em seu domínio. Não era possível distinguir rostos, menos ainda feições, e Li não poderia arriscar um tiro. Pois nesse momento ela pensou o óbvio: poderia ser Chou Xuefeng sendo sequestrado!
“Eunmi, Eunmi! Tem uma pessoa suspeita na rua onde você está!”, disse Li no intercomunicador, “Eunmi, Eunmi, pode ir lá verificar? Parece que é um refém!”.
Passou alguns segundos, mas não ouviu o retorno de Eunmi. Os dois vultos continuavam caminhando na rua detrás da casa, que devia ser guardada pela coreana, e cada vez mais se distanciavam do campo de visão de Li.
“Eunmi!! Eunmi!! Pessoa suspeita na sua rua!! Vai atrás deles!! Você tá me ouvindo, Eunmi?!”, repetiu Li no comunicador, mas não obteve resposta de Eunmi.
Ao virar o escopo para onde estava a coreana, viu que ela estava perto de uma viela, e gesticulando, parecia conversar com alguém. Mas ela não conseguia ver, pois a parede escondia a pessoa. Exceto um braço que segurava Eunmi, que estava de costas, sem prestar atenção nos vultos que andavam na rua logo atrás dela.
Li pegou uma lanterna e começou a piscar em direção de Eunmi, chamando sua atenção.
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“Eunmi-ya, vamos comigo pro Japão. Podemos trazer seus pais depois também. Teremos honra, um lar, sustento e uma vida segura como japoneses! Por favor! Eu só estou pensando no seu próprio bem!”, disse Jin-su, com um olhar clemente e cheio de esperanças. Aquilo confundiu Eunmi, é verdade. Mas essa confusão foi apenas por um segundo.
Ela então baixou sua cabeça e balançou, negando aquilo tudo. Voltou seu olhar para Jin-su. Um olhar firme, inabalável, que esbanjava uma determinação que falava por si só. Um olhar que foi como um ultimato para Jin-su, seguido pelo que ela iria dizer:
“Eu cheguei muito longe pra aceitar isso, Jin-su. Não irei. Se você quiser se juntar a mim, as portas estão abertas”, disse Eunmi, gentilmente tirando a mão de Jin-su que segurava seu braço, “Mas não irei aceitar isso. Não irei aceitar uma vida tranquila. Isso é o caminho fácil. E mesmo que eu morra tentando, quero tentar o caminho difícil, pois só assim conseguirei colocar minha cabeça no travesseiro a noite e ter um sono tranquilo, com a certeza de que eu ao menos tentei. Ir para o Japão, abandonar tudo sem tentar depois de tudo o que passei é como estar a poucos metros do cume da montanha e desistir da escalada. Não vou desistir. Não agora, sinto muito”.
As palavras foram ouvidas por Jin-su. Fechou os olhos por alguns segundos, tentando processar aquilo tudo. Ao abrir os olhos seu rosto ficou desfigurado pela raiva, completamente enfurecido, sobrancelhas arqueadas, mordendo os lábios e as rugas saltando às vistas. Não tinha nada a ver com a expressão serena de segundos atrás:
“Então não venha chorar depois, sua vaca imunda. Vai pra puta que o pariu, espero que arda no inferno, sua desgraçada. Você vai sofrer as consequências da sua escolha, não perde por esperar, sua puta desgraçada!”, esbravejou Jin-su, agarrando forte no braço de Eunmi e a puxando com violência: “Vem logo comigo, larga dessa merda!”.
Jin-su puxou Eunmi com força, que ainda estava assustada com toda aquela cena inusitada que o primo estava fazendo. Como era possível mudar a expressão de tamanha forma assim, subitamente? Era assustador e inacreditável. Jin-su apertava seu braço a ponto de doer, e a puxava com violência para dentro da viela, e Eunmi viu que só havia uma chance dela escapar daquilo.
“Me solta!! Jin-su, me solta agora!!”, pedia Eunmi, mas eram pedidos em vão. Jin-su sequer se virou para olhar pra ela. Só havia uma opção então. Eunmi fechou o punho e deu um potente golpe na cara de Jin-su quando ele se virou para encara-la. Instantaneamente ele a soltou, levando as mãos ao nariz, caindo no chão aos gritos. Eunmi se desiquilibrou um pouco, mas rapidamente retomou sua posição. Virou as costas pra ele e saiu correndo de volta para rua que ela devia guardar, e nesse momento viu algo que lhe chamou a atenção:
Uma luz, vindo do local onde Li estava, brilhando na sua direção. Ela se lembrou que estava sem o fone de ouvido e o colocou de volta. Foi então que reconheceu a voz de Li do outro lado.
“Eunmi!! Finalmente!! Rápido, tem duas pessoas cruzando a esquina lá na frente, corre lá e vai atrás deles!!”, ordenou Li, e Eunmi fez isso. Começou a correr desesperadamente atrás das duas pessoas que já estavam a muitos metros dela.
Mas quando ela passou pelos fundos da casa de Chou Xuefeng tomou um grande susto. Ouviu um mesmo grito, idêntico, sendo possível captar do rádio comunicador, como também de dentro da casa do fotógrafo chinês. Era a voz de Tsai. Mesmo depois de ouvir ela já não conseguia parar. A culpa de alguma forma a preenchia, por ter prestado tanta atenção nas asneiras do seu primo e não na missão que se desenrolava logo ali na sua frente. Mas o que Tsai havia berrado era realmente algo extremamente preocupante. Aquela cena, e o que veio a seguir, ficou gravada em sua mente como uma lembrança de profundo pânico e desespero:
“EMBOSCADA!! É UMA EMBOSCADA!!”, gritou Tsai.
Segundos depois do seu aviso uma explosão enorme se seguiu na casa de Chou Xuefeng, lançando detritos no ar e uma onda de choque imensa, quebrando casas na vizinhança no meio daquela imensa bola de fogo que subia aos céus. Eunmi continuava correndo, e nesse momento as duas pessoas que ela perseguia, os vultos que Li havia reconhecido, perceberam a explosão e que havia alguém muito próximo deles os seguindo e começaram a correr.
Entraram no primeiro beco à direita, com Eunmi correndo logo atrás. Na hora da curva Eunmi conseguiu ver o rosto do homem que estava sendo empurrado na frente, sem dúvidas era Chou Xuefeng. Ela virou no beco e continuou os seguindo, cada vez mais se aproximando, graças aos treinamentos de aptidão física que havia feito com Tsai. Quando a luz do poste os iluminou, Eunmi percebeu que o homem que estava atrás, sequestrando o da frente, virou o rosto e ela naquele momento viu o sequestrador.
Seu coração pareceu por um momento parar de susto quando viu quem era.
Era o mesmo homem loiro que, semanas atrás, havia mandado ela ir até a Alemanha atrás de Schultz, para que ele a pudesse ajudar na vingança pelo assassinato do seu noivo.
De início Schultz ficou meio desconcertado. Os dois ficaram se encarando e um gelo imenso surgiu entre os dois ali, a poucos metros de distância, em silêncio e sem graça, encarando um ao outro naquela rua deserta e escura à noite. Sem saber como reagir, Schultz ficou parado. Mas Chen, mais maduro, deu um pequeno sorriso pra Schultz e se virou pra continuar seu serviço.
Schultz viu então que aquilo tudo era besteira, e se aproximou de Chen. Aquele sorriso era sinal de que ele bem mais simpático do que imaginava. Ao se aproximar de Chen, Schultz se agachou do seu lado e começou a ajuda-lo. Quando Chen percebeu que Schultz estava lá do seu lado foi a vez de Schultz dar um sorriso simpático para o chinês que ele praticamente desconhecia.
“Acho que a gente nunca chegou a conversar muito, né?”, disse Schultz, tomando cuidado para não falar alto. Chen não havia se virado para Schultz, logo fez cara de quem não entendeu, e fez um gesto para que ele repetisse, e alemão repetiu a mesma coisa, gesticulando bastante e abrindo bem a boca, para que Chen eventualmente pudesse compreender, mas ainda manteve o tom baixo para não denunciar seu local para Chou Zuefeng ou os militares japoneses dos arredores.
“É verdade. Mas não pense que eu sou antipático. Apenas sou uma pessoa mais introspectiva”, disse Chen, e Schultz ficou surpreso! Era uma das poucas vezes que ele havia ouvido a voz de Chen, que era bem grave. Uma voz que contrastava com sua aparência frágil e baixa estatura. Ainda surpreso em estar trocando palavras com o chinês, Schultz não sabia o que responder. Foi Chen que prosseguiu: “A minha esposa já fala bastante por nós dois, haha. Então eu prefiro não incomodar. Sou uma pessoa um bocado tímida também”.
“Tímido? Nossa, não parece. A gente nem teve como conversar, e esqueço que você não é totalmente surdo. Acho que no fundo é um preconceito besta que eu tenho, você entende perfeitamente o que digo”, disse Schultz, da mesma maneira que antes, gesticulando e abrindo bem a boca pra falar para ajudar Chen a entende-lo melhor. De fato funcionou, pois Chen sequer pediu pra ele repetir.
“Eu sou bom em leitura labial. Eu meio que sempre fui antes, eu era quase que um espião pra decifrar conversas de longe, usando binóculo, apenas fazendo leitura labial para a Gongzhu. Não precisa gesticular tanto, senhor Schultz. Consigo entender mesmo se você fizer um movimento mínimo de lábios”, disse Chen, dando uma piscadinha. Schultz então se surpreendeu. Pensava que Chen era uma pessoa perdida no grupo, uma pessoa que não falava muito e ouvia nada. Uma pessoa que apenas servia para explodir as coisas e só. Mas no fundo Chen sabia exatamente tudo o que estava acontecendo ao seu redor, mesmo que não conseguisse ouvir com os ouvidos. Ele ouvia com os olhos, por meio de uma leitura labial avançadíssima.
“Cara, incrível, mudou completamente o que pensava sobre você, pra melhor. Isso aí é pra quê?”, perguntou Schultz, apontando para os explosivos na porta. Eram pastilhas, não pareciam capazes de grande coisa.
“É uma coisa que criei. Funciona para arrombar portas, mas com explosivos. A explosão é relativamente baixa e apenas estoura a porta, permitindo a gente entrar”, explicou Chen, apontando para as pastilhas explosivas coladas na madeira da porta, perto da fechadura e dos trincos, “O Huang era ótimo com fechaduras, mas infelizmente ele não está aqui. Então vai ser do meu jeito mesmo, a Gongzhu permitiu, apesar do perigo do barulho”.
“Invenção sua?”, disse Schultz, olhando mais de perto as pastilhas, “Você pode ser quietinho, mas é bem inteligente!”.
Chen deu um sorriso para Schultz. Aquela conversa poderia ter sido curta, mas havia quebrado as primeiras impressões que cada um tinha do outro. Schultz imaginava Chen um antissocial, mas ele era apenas uma pessoa mais introspectiva, e incrivelmente inteligente. Já Chen achava Schultz um antipático, mas se surpreendeu ao ver que o alemão era uma pessoa muito melhor que ele poderia imaginar.
“Estou só no aguardo da ordem da Gongzhu. Ela já está vindo?”, perguntou Chen.
“Na verdade ainda não, ela está combinando as coisas com a Eunmi, Li, Chou, etc. Eu vim aqui apenas ver como estava o andamento das coisas que você tá fazendo, mas vou voltar lá e ver como está a situação! Com licença, Chen”, disse Schultz, se retirando da frente de Chen, que sorrindo novamente, confirmou com a cabeça. Chen era realmente muito simpático e bem mais bacana do que imaginava. O alemão então fez o caminho de volta de poucos metros até onde todas estavam reunidas, e viu Tsai descendo com Ho, enquanto Chou ficava ainda lá em cima, perto de Li que estava com seu rifle de atiradora de elite a postos, observando todo o movimento na rua.
“Vamos, Schultz”, disse Tsai, se aproximando de Schultz, “Vou deixar a Chou de olho no Yamada. E também a postos caso alguém precise de cuidados médicos. Vamos eu, você e a Ho invadir a casa e retirar Chou Xuefeng de lá”, nessa hora Tsai cruzou Schultz e seguiu em direção da casa que iriam invadir ao lado de Ho, enquanto Schultz continuava parado lá as observando. Tsai, ainda caminhando, se virou para Schultz e completou, dizendo o resto do planejamento: “Eunmi vai ficar na rua detrás. Li vai nos dar o suporte como atiradora de elite. Todos nós estaremos ligados nos rádios intercomunicadores no ouvido, deixe o seu ligado também”.
“Sim, princesa! Já estou indo!”, disse Schultz, acelerando o passo indo até Tsai.
“Ei, Schultz!”, disse Li, num tom alto, chamando Schultz lá de cima da casa, “Proteja a Gongzhu, viu! Mesmo que isso signifique sacrificar sua vida!”.
Schultz deu um riso ao ouvir e se virou para Li antes de responder:
“Ah, qual é, menina! Tá parecendo discurso de quem vai morrer em filme! Isso vai ser mais fácil que roubar doce de criança, daqui uns cinco minutos estamos de volta. Vê se fica de olho aí pra nos proteger!”, disse Schultz, voltando a acelerar o passo na direção de Tsai e Ho. Antes de entrar na casa viu Eunmi cruzando o quarteirão do outro lado, e bem nessa hora a coreana se virou e viu Schultz lá, perto da entrada. Ele fez um sinal de positivo com o polegar pra coreana que retribuiu, seguindo seu caminho. Todos estavam a postos.
“Pode arrombar a porta, Chen, por gentileza”, disse Tsai, via rádio. Chen se preparou pegando o gatilho do explosivo, “Lembrem-se: Chou Xuefeng deve ser capturado vivo a qualquer custo. Iniciando extração, agora!”.
E a explosão dilacerou a porta.
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Eunmi, já chegando na saída dos fundos da casa de Chou Xuefeng ouviu no rádio comunicador no seu ouvido a ordem de Tsai para começarem a missão. A explosão foi um pouco mais baixo que um rojão, era difícil pra ela imaginar que aquele barulho era capaz de destroçar uma porta, mas ao mesmo tempo era impossível de passar desapercebido, ainda mais no meio da noite.
Espero que isso não atraia japoneses aqui. Vamos ter sérios problemas se tivermos que proteger esse fotógrafo ao mesmo tempo que entramos em combate com soldados japoneses, pensou Eunmi. Ela esticou o pescoço e viu que não era possível ver o ponto em que Li estava, exceto alguns metros dali. Logo essa saída dos fundos da casa do chinês era um ponto cego para Li, que não tinha como saber se o chinês fugiria por ali.
Ao seu redor Eunmi via algumas casas, e ao prestar mais atenção via que, apesar de estarem as luzes desligadas, era possível ver os olhos brilhando de quem estava espiando de dentro o movimento na rua, refletindo as luzes da iluminação pública. A explosão chamou a atenção da vizinhança, mas o clima em Nanquim não era dos melhores. Pessoas tinham medo. Medo inclusive de espiar.
Eunmi de alguma forma passava mal naquela situação, uma vez que parecia que haviam tantas pessoas a observando. Mas nessas horas ela tentava voltar ao foco da missão. Sua missão era proteger aquele local, e pegar Chou Xuefeng caso ele tentasse fugir.
“Ei, Eunmi-ya! Eunmi-ya!”, disse uma voz masculina atrás dela. Ao se virar viu que a alguns metros dali havia uma pessoa. Ao se aproximar, teve uma péssima surpresa. Era seu primo, Jin-su. Novamente.
“Eu já disse pra me deixar em paz, Jin-su!”, disse Eunmi, impaciente.
“Eunmi-ya, vem aqui, vamos conversar! Desliga esse comunicador, rapidinho, vem!”, disse Jin-su, apontando pro ouvido. Mais tarde, enquanto refletia as consequências dessa escolha, ela relembrou que nesse momento ela não tinha a intenção de dar ouvidos ao que Jin-su queria falar. Deixaria ele falando ali, ou daria algum golpe para apaga-lo. Jin-su, apesar de ser da sua família, havia feito algo que ela jamais conseguiria perdoar. Essa proposta de irem morar no Japão a custo de sua identidade tinha feito ela se sentir profundamente indignada. Ela apenas se aproximou de Jin-su depois que ele, ao ver que ela não chegaria perto dele de forma alguma, disse as seguintes palavras: “Eu te devo desculpas!”.
“Desculpas?”, disse Eunmi, tirando o fone do ouvido e desligando seu comunicador, “Ainda bem que você desistiu dessa loucura de ir morar no Japão e virar japonês!”.
Mas Jin-su baixou a cabeça e balançou negativamente. Eunmi não podia acreditar no que ele falaria a seguir.
“Não, Eunmi, eu não desisti de ir morar no Japão. Eu vim exatamente pedir desculpas por ter sido grosso com você antes, mas não vim pedir desculpas por ter proposto você ir comigo e termos uma nova vida no Japão”
“Eu não acredito! Você ainda insiste nisso?”.
“Eunmi, por favor venha comigo! Larga tudo, deixa eles se virarem aí, eles não te devem nada! De manhã vamos cruzar o mar até o Japão, temos uma casa garantida, um emprego, uma nova vida! Que se explodam essas coisas de honra que você tem, a gente tem é que pensar na nossa sobrevivência em primeiro lugar! A vida real não tem espaço pra sonhos ou utopias!”.
“Eu já te disse que eu não vou, Jin-su! Se quiser ir, vá sozinho! Eu tenho uma missão, faço parte de um grupo que não quer suprimir quem eu sou. Querem me ajudar, e eu quero ajuda-los em troca também! Essas pessoas me inspiram todos os dias para que eu dê meu melhor! Não desperdice seu tempo, nem o meu tempo tentando me convencer de algo que eu jamais aceitarei!”.
Mas nessa hora Jin-su avançou e segurou no braço de Eunmi. Ao olhar sua expressão Eunmi viu que ele não tinha raiva. Até que não estava apertando. Era uma abordagem diferente, mas ao mesmo tempo igual do que ele havia feito. Ela podia ver o clamor nos olhos dele. E talvez por um segundo ela teve dúvida. Será que não seria melhor ir para o Japão e ter uma nova vida lá, do que morrer como uma coreana por ter desafiado o exército japonês que os havia conquistado?
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Tsai, Schultz e Ho entraram na casa. A casa de Chou Xuefeng era pequena e não tinha nenhum andar superior. Em segundos poderia ser completamente vista e checada, então Tsai apontou para Ho e Schultz irem para a cozinha e pra sala, respectivamente, enquanto ela ia direto no quarto dele.
Chen os esperava do lado de fora, prestando atenção no movimento da rua, junto de Li que estava de olho em tudo através do visor do seu rifle de atirador de elite.
Tá tudo calmo. Calmo até demais, disse Schultz enquanto verificava a sala. Tinham algumas fotografias espalhadas em quadros ao redor, mas não era possível descrever com exatidão por conta da escuridão. A parca luz que vinha da janela iluminava muito mal o local, mas ainda assim era possível ver que não havia ninguém lá. O cômodo estava limpo.
Ho também viu que apesar da louça para lavar, tudo parecia bem. Um pouco de comida nas panelas, e ao abrir ela viu que era arroz. Talvez o fotografo era mais do sul da China, onde eles tinham mais o costume do comer arroz, ao contrário do norte que usualmente preferem macarrão. A cozinha era iluminada por um lampião, aparentemente ligado para caso o chinês precisasse pegar algo na cozinha na noite. Mas ao verificar nos cantos, Ho percebeu que o local também estava limpo.
Tsai então entrou no quarto, sem fazer barulho. Caminhando lentamente, viu que a cama estava desarrumada, e era possível distinguir um volume debaixo das cobertas. Fazia frio, era sensato estar tão coberto assim.
“Alvo localizado, ele está aqui. Estou me aproximando”, disse Tsai, via rádio, para todos ouvirem.
Com sua pistola em punhos, a Gongzhu foi se aproximando passo a passo. Colocou a mão no cobertor e sentiu algo estranho nos seus dedos. Não teve muito tempo para pensar. Puxou o cobertor para revelar quem estava debaixo daquilo.
Tsai tomou um susto enorme nesse momento.
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Momentos antes de Tsai entrar no quarto de Chou Xuefeng, Li continuava de olho nos arredores. Estava de noite, e obviamente eles não tinham condições de terem escopos de visão noturna, uma novidade militar da época. Mas ainda assim dificilmente algo escaparia da visão aguçada e treinada de Li.
Na rua da frente era possível ver que não havia nenhum movimento. Estava deserta. Conforme Li ia virando o escopo pra observar toda a extensão da rua, percebeu ao longe um movimento na rua de trás. Por conta da escuridão, era possível ver apenas quando o vulto era iluminado pelas luzes do postes. O que uma pessoa fazia tarde da noite ali?
Ao aproximar o visor do vulto percebera que na verdade não era uma pessoa. Eram duas. Era possível ver que havia uma pessoa atrás de outra, caminhando na calçada, olhando para trás enquanto empurrava a pessoa na frente, que parecia estar em seu domínio. Não era possível distinguir rostos, menos ainda feições, e Li não poderia arriscar um tiro. Pois nesse momento ela pensou o óbvio: poderia ser Chou Xuefeng sendo sequestrado!
“Eunmi, Eunmi! Tem uma pessoa suspeita na rua onde você está!”, disse Li no intercomunicador, “Eunmi, Eunmi, pode ir lá verificar? Parece que é um refém!”.
Passou alguns segundos, mas não ouviu o retorno de Eunmi. Os dois vultos continuavam caminhando na rua detrás da casa, que devia ser guardada pela coreana, e cada vez mais se distanciavam do campo de visão de Li.
“Eunmi!! Eunmi!! Pessoa suspeita na sua rua!! Vai atrás deles!! Você tá me ouvindo, Eunmi?!”, repetiu Li no comunicador, mas não obteve resposta de Eunmi.
Ao virar o escopo para onde estava a coreana, viu que ela estava perto de uma viela, e gesticulando, parecia conversar com alguém. Mas ela não conseguia ver, pois a parede escondia a pessoa. Exceto um braço que segurava Eunmi, que estava de costas, sem prestar atenção nos vultos que andavam na rua logo atrás dela.
Li pegou uma lanterna e começou a piscar em direção de Eunmi, chamando sua atenção.
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“Eunmi-ya, vamos comigo pro Japão. Podemos trazer seus pais depois também. Teremos honra, um lar, sustento e uma vida segura como japoneses! Por favor! Eu só estou pensando no seu próprio bem!”, disse Jin-su, com um olhar clemente e cheio de esperanças. Aquilo confundiu Eunmi, é verdade. Mas essa confusão foi apenas por um segundo.
Ela então baixou sua cabeça e balançou, negando aquilo tudo. Voltou seu olhar para Jin-su. Um olhar firme, inabalável, que esbanjava uma determinação que falava por si só. Um olhar que foi como um ultimato para Jin-su, seguido pelo que ela iria dizer:
“Eu cheguei muito longe pra aceitar isso, Jin-su. Não irei. Se você quiser se juntar a mim, as portas estão abertas”, disse Eunmi, gentilmente tirando a mão de Jin-su que segurava seu braço, “Mas não irei aceitar isso. Não irei aceitar uma vida tranquila. Isso é o caminho fácil. E mesmo que eu morra tentando, quero tentar o caminho difícil, pois só assim conseguirei colocar minha cabeça no travesseiro a noite e ter um sono tranquilo, com a certeza de que eu ao menos tentei. Ir para o Japão, abandonar tudo sem tentar depois de tudo o que passei é como estar a poucos metros do cume da montanha e desistir da escalada. Não vou desistir. Não agora, sinto muito”.
As palavras foram ouvidas por Jin-su. Fechou os olhos por alguns segundos, tentando processar aquilo tudo. Ao abrir os olhos seu rosto ficou desfigurado pela raiva, completamente enfurecido, sobrancelhas arqueadas, mordendo os lábios e as rugas saltando às vistas. Não tinha nada a ver com a expressão serena de segundos atrás:
“Então não venha chorar depois, sua vaca imunda. Vai pra puta que o pariu, espero que arda no inferno, sua desgraçada. Você vai sofrer as consequências da sua escolha, não perde por esperar, sua puta desgraçada!”, esbravejou Jin-su, agarrando forte no braço de Eunmi e a puxando com violência: “Vem logo comigo, larga dessa merda!”.
Jin-su puxou Eunmi com força, que ainda estava assustada com toda aquela cena inusitada que o primo estava fazendo. Como era possível mudar a expressão de tamanha forma assim, subitamente? Era assustador e inacreditável. Jin-su apertava seu braço a ponto de doer, e a puxava com violência para dentro da viela, e Eunmi viu que só havia uma chance dela escapar daquilo.
“Me solta!! Jin-su, me solta agora!!”, pedia Eunmi, mas eram pedidos em vão. Jin-su sequer se virou para olhar pra ela. Só havia uma opção então. Eunmi fechou o punho e deu um potente golpe na cara de Jin-su quando ele se virou para encara-la. Instantaneamente ele a soltou, levando as mãos ao nariz, caindo no chão aos gritos. Eunmi se desiquilibrou um pouco, mas rapidamente retomou sua posição. Virou as costas pra ele e saiu correndo de volta para rua que ela devia guardar, e nesse momento viu algo que lhe chamou a atenção:
Uma luz, vindo do local onde Li estava, brilhando na sua direção. Ela se lembrou que estava sem o fone de ouvido e o colocou de volta. Foi então que reconheceu a voz de Li do outro lado.
“Eunmi!! Finalmente!! Rápido, tem duas pessoas cruzando a esquina lá na frente, corre lá e vai atrás deles!!”, ordenou Li, e Eunmi fez isso. Começou a correr desesperadamente atrás das duas pessoas que já estavam a muitos metros dela.
Mas quando ela passou pelos fundos da casa de Chou Xuefeng tomou um grande susto. Ouviu um mesmo grito, idêntico, sendo possível captar do rádio comunicador, como também de dentro da casa do fotógrafo chinês. Era a voz de Tsai. Mesmo depois de ouvir ela já não conseguia parar. A culpa de alguma forma a preenchia, por ter prestado tanta atenção nas asneiras do seu primo e não na missão que se desenrolava logo ali na sua frente. Mas o que Tsai havia berrado era realmente algo extremamente preocupante. Aquela cena, e o que veio a seguir, ficou gravada em sua mente como uma lembrança de profundo pânico e desespero:
“EMBOSCADA!! É UMA EMBOSCADA!!”, gritou Tsai.
Segundos depois do seu aviso uma explosão enorme se seguiu na casa de Chou Xuefeng, lançando detritos no ar e uma onda de choque imensa, quebrando casas na vizinhança no meio daquela imensa bola de fogo que subia aos céus. Eunmi continuava correndo, e nesse momento as duas pessoas que ela perseguia, os vultos que Li havia reconhecido, perceberam a explosão e que havia alguém muito próximo deles os seguindo e começaram a correr.
Entraram no primeiro beco à direita, com Eunmi correndo logo atrás. Na hora da curva Eunmi conseguiu ver o rosto do homem que estava sendo empurrado na frente, sem dúvidas era Chou Xuefeng. Ela virou no beco e continuou os seguindo, cada vez mais se aproximando, graças aos treinamentos de aptidão física que havia feito com Tsai. Quando a luz do poste os iluminou, Eunmi percebeu que o homem que estava atrás, sequestrando o da frente, virou o rosto e ela naquele momento viu o sequestrador.
Seu coração pareceu por um momento parar de susto quando viu quem era.
Era o mesmo homem loiro que, semanas atrás, havia mandado ela ir até a Alemanha atrás de Schultz, para que ele a pudesse ajudar na vingança pelo assassinato do seu noivo.
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