Amber #134 - Suspicious minds (11)

Tsai não gostava de exercer liderança. Porém ela sempre teve um imã, algo impossível de se quantificar e explicar, quando o assunto era exercer o papel de líder. Ser líder era sempre algo que dava dor de cabeça, era um trabalho ingrato onde todos pensam que você fica apenas sentado dando as ordens, quando um real líder é o que trabalha o dobro, o triplo, ou até mais vezes, pois possui o seu papel pessoal e mais o fato de ter que gerenciar todos os outros ao mesmo tempo.

E ela obviamente tinha muitas preocupações. Era sempre um peso enorme sobre os seus ombros. Isso sem contar os outros membros que ela não via há alguns dias, como Li, Chou, Eunmi e Chen. Até mesmo com o Yamada ela se preocupava. Ela nem tinha ideia do que havia acontecido com eles.

Enquanto estava imersa em seus devaneios, a chinesa olhou para ao longe do salão e viu Schultz do outro lado, conversando com uma pessoa. Um homem chinês estranho, que ela obviamente não tinha ideia de quem se tratava.

Ela começou então a dar alguns passos na direção do alemão, porém antes mesmo de fazê-lo ela hesita. Poderia encurralar Chang Ching-chong, e ele fugir, com medo. Ela tinha que pensar em uma outra alternativa.

É isso! O Huang está lá em cima observando e ouvindo tudo! Ele pode me passar informações! Preciso voltar e pegar o gancho para falar com ele!, pensou Tsai, que voltou a passos rápidos para o local onde estava o gancho de telefone escondido, que ela estava usando para se comunicar com Huang.

Porém, no momento que ela estava retornando, uma pessoa passou na sua frente, acompanhado de duas mulheres. Claramente era um homem. Nesse momento Tsai sentiu algo em seu coração, e esse algo ficou ainda mais forte depois que os caminhos se cruzaram. Porém naquele primeiro ela ignorou, e seguiu seu caminho para o seu lado esquerdo, enquanto aquela pessoa que havia lhe brotado o pressentimento foi pelo direito.

Ela parou e olhou para o lado. O que era aquilo? Mesmo que ela tivesse visto o rosto apenas de lado, e de relance, parecia um rosto familiar. Um rosto que ela reconheceria no meio de milhões.

Mas onde que ela o tinha visto? Aquele pressentimento estranho era algo forte. Forte o suficiente para fazê-la querer tirar aquela estranha dúvida. Tsai foi calmamente se aproximando do homem, que falava alto, abraçado com as duas mulheres e com um grande charuto na mão. Usava terno, talvez fosse um dos muitos figurões presentes naquela festa.

O homem se aproximou do bar e se sentou. Pediu alguns drinques e então subitamente se virou, voltando a colocar as mãos nas cinturas das duas mulheres que o acompanhavam.

E quando Tsai o viu, seu coração quase que parou.

Era como se ela fosse transportada para aquele sonho que ela teve na última noite. A noite do sonho do “die Aurikel”. Tudo era muito inexplicável. Ao mesmo tempo era inconfundível. Ao ver aquela feição, aquele rosto, o cabelo. Tsai não tinha absolutamente nenhuma dúvida de quem se tratava.

O homem que cruzou na sua frente era calvo, mas não completamente careca. Tinha cabelo branco, e apenas uma mecha preta se destacando em meio os seus parcos fios. Apesar da idade ele não tinha barriga, e nenhum único fio de barba. Além de obviamente ser claramente chinês.

Em outras palavras, esse homem a poucos metros de Tsai era exatamente igual ao Chang Ching-chong que lhe havia aparecido em sonho.

“Você? É você mesma, Hime-samá? Não acredito que estou na frente de uma lenda viva como você!”.

Tsai percebera que a voz feminina que dizia isso vinha das suas costas. De início a ignorou. Ali ela não era Tsai, não era Gongzhu, e menos ainda “Hime-samá”, que é a forma japonesa (e respeitosa) de chamá-la de “princesa”, seu codinome. A chinesa estava de frente para o homem que havia aparecido em seu sonho, e ela tinha que ter certeza se era ele ou não, para ter certeza se tratava de Chang Ching-chong.

“Será que ela me ouviu?”, disse a voz feminina que a chamou de Hime-samá.

“Eu não sei. Acho que não. Tá uma barulheira aqui”, disse uma voz masculina.

“Ei, coreana, vai lá atrás dela. Anda logo”, disse a voz feminina.

Mas Tsai continuou fingindo que não era com ela. Conforme ela caminhava elegantemente na direção do homem que ela havia sonhado, parecia que todas as pessoas abriam o caminho, deslumbrados com aquela linda chinesa que vestia aquele belíssimo vestido vermelho. Era o charme, uma coisa quase que irresistível, que fazia todas as pessoas se curvarem diante daquela beleza ímpar expressada em cada caminhar.

Tudo parecia certo. Até o momento que uma pessoa lhe puxou o braço por trás. Tsai parou por um instante, e foi virando lentamente.

“Gongju!”, disse Eunmi, e Tsai tomou um susto ao reconhecê-la, “Minha nossa, como você está linda! Eu sabia que era você, tinha que ser você!”.

“Eunmi? O que você está fazendo aqui?”, perguntou Tsai, abraçando sua pupila, “Olha só para você! Você também está toda produzida!”.

Eunmi ficou vermelha depois do elogio de Tsai. Significava muito um elogio daqueles vindo de uma mulher feita, e também de sua mestra e grande inspiração.

“Eu entrei na festa com a ajuda de duas pessoas, Gongju! Resumindo bem, são dois amigos japoneses”, disse Eunmi, baixinho, e quando Tsai ouviu que eram japoneses ela se assustou, “Sim, mas não são do time dos malvados não! São ótimas pessoas. Eles também querem acabar com todo esse banho de sangue, cansados de serem usados como ferramentas do governo”.

“E onde eles estão?”, perguntou Tsai, mas ela já imaginava a resposta da coreana.

Eunmi então deu meia volta e apontou com a cabeça para um casal sentado logo atrás de onde ela estava. A mulher estava sentada numa mesinha, com um copo de champanhe ao lado, enquanto o homem estava ao lado dela, ambos olhando na direção de onde estava Tsai e Eunmi. Eles estavam extremamente elegantes, mas não chamativos. A contragosto Tsai foi se aproximando deles junto de Eunmi, embora estivesse com muito mais vontade de espiar o homem que era idêntico ao Chang Ching-chong do seu sonho, e tirar essa dúvida e averiguar a estranha coincidência.

Mas no final Tsai, sempre uma pessoa racional, vira que era muito estranho que aquele homem fosse Chang Ching-chong. Poderia ser apenas uma coincidência. Era extremamente improvável que em um sonho algo acontecesse assim, a ponto de refletir na vida real. As chances eram de praticamente zero. Estava já aceitando que tudo aquilo era parte de uma infeliz coincidência.

“Eu não acredito, é você mesma! Chugoku-no-hime”, disse Aomame, chamando Tsai de ‘princesa da china’ em japonês, “Você é bem mais alta, e bem mais bonita do que a propaganda japonesa te descreve. São todos uns bastardos mesmo! Não consigo acreditar que estou na frente da pessoa que mesmo sem eu nunca conhecer me inspirou. Nunca imaginaria que eu te conheceria numa circunstância como essa, Hime-samá”.

“Deu pra notar que nem preciso me apresentar”, disse Tsai, sem jeito. Realmente a japonesa parecia olhar com olhos de profunda admiração e felicidade quando Tsai apareceu na sua frente, “E vocês, quem são?”.

“Meu nome é Mayuko Aomame, e esse aqui é o meu colega, Tengo Kawase. É uma honra conhecer você, Tsai Louan. Ou como os chineses a chamam, ‘Gongzhu’”, disse Aomame.

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