Amber #3 - Você bateria em alguém de óculos?

17 de abril de 1937

Schultz odiava esperar. Estava ao lado de Briegel sentado na mesa de uma das muitas salas de reunião da SD aguardando a chegada do chefão do lugar. Batia dos dedos na mesa, impaciente, olhava pra janela esperando o momento que a porta iria se abrir. Já Briegel estava calmo, com as mãos em cima da mesa, os dedos entrelaçados, quase dormindo de tão calmo que estava.

“Senhor Schultz, senhor Briegel, por favor, levantem-se. Herr Himmler está chegando”, anunciou um dos soldados abrindo a porta logo atrás de Briegel e Schultz..

Briegel se ergueu e ficou em posição de sentido, porém não ergueu e esticou seu braço direito no popular gesto de “Heil, Hitler”, muito comum naquela época, como um culto ao próprio Hitler. Já Schultz, continuou sentado, numa posição bem folgada, sequer se virou pra ver Himmler, que entrou com rosto raivoso fitando os dois.

“Está atrasado, imbecil”, bufou Schultz.

Himmler fez um gesto e os soldados saíram, fechando a porta para que pudesse ficar a sós com Schultz e Briegel. Briegel se sentou depois que Himmler se acomodou. Himmler era baixinho perto deles. Briegel tinha 1,90m, e Schultz tinha 1,88m. Eram gigantes perto do braço-direito de Hitler que tinha apenas 1,78m.

“Briegel, porque não fez a saudação?”, questionou Himmler, enquanto folheava as papéis da investigação de Briegel e Schultz.

“Peço desculpas. Achei que como eram apenas nós, achei desnecessário”, mentiu Briegel. Ele detestava essa saudação, achava uma coisa brega e idiota.

“É, pelo visto mentira não é um dos seus fortes. Ou talvez você queria que eu soubesse, enfim, isso não vem ao caso”, disse Himmler, ainda apenas olhando os papéis sem nem olhar pra eles.

O local ficou em silêncio por pelo menos uns dois minutos. Himmler olhava folha por folha com atenção, reclinado em frente à mesa, e com uma caneta ia riscando e fazendo diversas observações. Briegel estava calmo, apenas aguardando se viria alguma pergunta. Schultz estava olhando para o teto, totalmente relaxado em cima da cadeira, demostrando um incrível tédio.

“Que cheiro é esse?”, perguntou Himmler, “Será que está vindo do encanamento…?”

“Ah, foi mal. Eu peidei, ô quatro olhos”, disse Schultz dando um risinho sarcástico, “Não deu pra segurar, acho que foi o repolho que comi ontem”.

“Schultz! Por deus!”, repreendeu Briegel, baixinho. Por mais que Briegel detestasse o regime, ele não era o tipo de pessoa que dizia isso publicamente. Tinha que manter as aparências. Mas Schultz, quando viu que seu amigo estava repreendendo-o, arqueou as sobrancelhas como se quisesse mostrar um ar irônico. Briegel não se aguentou e deu uma gargalhada abafada, que depois ele próprio fingiu que era um engasgo. Heinrich Himmler, obviamente, estava vendo tudo.

“Olha aqui, eu não gosto de vocês. Não gosto mesmo. E o único motivo de vocês ainda estarem aqui é apenas porque vocês são os melhores agentes que esse país tem. Se não fosse por isso, eu teria enviado vocês dois pro fuzilamento, seus idiotas!”, brigou Himmler.

“Tô cagando e andando pra você, seu tampinha”, disse Schultz, provocando.

“Ora seu…”, disse Himmler, se voltando pra Briegel, “Você, Briegel, você é o mais responsável e o líder. Porque raios não dá você mesmo uma lição nesse arruaceiro de merda?”.

“Eu? Sinto muito! Não posso fazer nada”, disse Briegel, erguendo os braços, como se dissesse que não dava a mínima pra isso.

Heinrich Himmler nessa hora se sentiu acuado. Aqueles dois na sua frente eram agentes do mais alto nível, e ele não tinha nenhum poder sobre eles. Eram pessoas que sabiam exatamente o que era o regime nazista e as atrocidades que estavam fazendo, porém não se submetiam a Hitler e nem a ninguém. Eram agentes da Inteligência que faziam o que queriam. Talvez os únicos homens realmente livres de todo um país. E ser um homem livre, que Himmler não pudesse controlar, isso sim era algo que o deixava furioso.

“SEUS FILHOS DA PUTA!”, gritou Himmler, “Calem a boca vocês dois agora, que eu vou falar aqui! Vocês são funcionários do Führer, vocês devem sua lealdade a ele! Acham que eu não acho que vocês apenas querem fazer o que vocês querem? Eu juro que vou fazer a cabeça deles e vou mandar vocês dois direto pro fuzilamento e quando vocês chegarem lá serei eu mesm…”

Nessa hora Schultz se ergueu e desferiu um soco potente no rosto de Himmler. Ele foi jogado pra fora da mesa e caiu de costas no chão. Seu óculos estava completamente torto, mas ainda assim a lente não quebrou.

“Foi mal. Você disse pra eu calar a boca, mas não disse nada sobre socar a sua boca. Devia ser mais específico na próxima vez”, disse Schultz.

Briegel estava do lado, olhando pra Himmler como se dissesse a ele que sabia que isso iria acontecer. Himmler tentou se erguer, mas como estava muito tonto, caiu uma vez, se agarrando na mesa antes. Seu óculos redondo estava completamente torto, e ele tremia por conta do susto. Seus olhos lacrimejavam e seu nariz estava jorrando sangue.

“Bom, o senhor pediu pra gente trazer o nome da pessoa que estava traficando armas porque vocês receberam uma ameaça de insurreição no sul da Alemanha. Consegui achar um soviético exilado aqui, Leon Fyodorov, ele tem conhecimentos no submundo, consegui ganhar sua confiança e arrancamos dele o nome. Parece que ele é um judeu francês, de nome Abner Sarkin, ele vive em Munique”, disse Briegel, batendo na mesa, se erguendo pra ir embora, “Bom, agora é contigo, o relatório tá aí. Precisamos ir embora”.

“Esperem, imbecis”, disse Himmler. Schultz já estava a passos largos indo embora na frente.

“Ah, qualé! Dá um tempo, cara”, disse Schultz, encarando Himmler.

“Vocês acharam alguma relação desse Sarkin com o desaparecimento dos engenheiros bélicos?”, perguntou Himmler.

Briegel, que estava já de costas e dado alguns passos em direção à saída, se virou e fitou Himmler.

“Não. Apenas suposições. Mas muita coisa aponta pra ele, mas não temos certeza”, disse Briegel.

“Certo”, disse Himmler, pegando um lenço e limpando o sangue que escorria do seu nariz, “Segunda-feira vocês irão pra Munique. Quero que espionem tudo sobre esse tal de Sarkin. Se foi ele quem sequestrou ou não, quero pistas. Esses engenheiros devem ser resgatados custe o que custar, e vivos, entenderam?”, ordenou Himmler.

Schultz olhou pra cima, como se estivesse sem paciência. Ele queria na verdade dar outro soco na fuça de Heinrich Himmler. Já Briegel encheu os pulmões de ar e soltou, fazendo barulho.

“Tá. Vamos pegar as passagens lá com o pessoal. Até mais”, disse Briegel, saindo.

“E vê se não se atrasa de novo, viu oclinhos?”, repreendeu Schultz.

Himmler preferiu não retrucar.

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