Amber #45 - Pérola Negra

5 de setembro de 1939
20h29

Baden é uma cidade histórica próxima de Viena. Um local tranquilo onde pessoas podiam ter a praticidade da capital com o conforto de uma vida mais simples. Briegel, Liesl, e Alice alugaram as melhores roupas de gala e foram até o famoso cassino da cidade. Figurões nazistas austríacos estavam lá, e era notável que até mesmo a fama de Briegel havia chegado lá.

“Boa noite, sogro!”, disse Max, ao ver Briegel por lá, “Como estão as coisas?”.

“Ah, Max! Obrigado por ter atendido o meu pedido e vindo até aqui. As garotas já devem estar chegando”, disse Briegel, “Na verdade estou atrás de pistas sobre uma pessoa envolvida naquele bombardeamento de Guernica, há dois anos. Minha informante marcou aqui pra nos encontrarmos”.

“Ótimo! Eu tava precisando mesmo de uma folga”, disse Max, “Não tenho dúvidas que Liesl e Alice estarão deslumbrantes”, Max percebeu que Briegel parecia um pouco nervoso, com o rosto meio sério e apreensivo, “Você não parece estar com uma cara boa, sogro”.

“Sim. Não é tanto sobre a informante que temo...”, disse Briegel, fazendo uma pausa, “...Mas quero te pedir um favor. Que convença Alice a voltar com você”.

Nessa hora os dois ouviram um furor na porta da frente. Muitas pessoas começaram a olhar pra lá, como se alguma celebridade ou alguém importante estivesse chegando. Briegel e Max olharam, mas não foram até lá, continuaram nos seus lugares conversando.

“Sogro, sabe que é complicado convencer sua filha”, disse Max, se voltando pra Briegel, ficando de costas ao furor na entrada.

“Eu sei”, disse Briegel olhando com profunda consternação pra Max, “Mas eu te imploro, por favor. Ela jamais me ouviria. Mas você é o marido dela, talvez consiga convencê-la a se esconder. Pelo menos até as coisas se atenuarem”.

“Entendo. Também temo pela segurança dela, tanto quanto o senhor”, disse Max, sorrindo pra Briegel com confiança, “Pode deixar que vou tentar. Vai ser difícil, mas tentarei”.

Briegel ouviu as palavras de Max, e ficou com uma expressão mais tranquila no rosto. Pessoas ao redor começaram a cochichar entre si, como se alguém importante tivesse chegado ao local. Porém de súbito Briegel permaneceu estático olhando para a entrada. Max, que estava de costas pra porta e pra onde estava o furor, olhava pro rosto de Briegel e não entendia o que estava acontecendo. Max reparou então que a expressão de seu sogro mudou pra um sorriso.

“Ei, Max, olha lá!”, disse Briegel, apontando com o rosto, “Parece que sua pérola negra chegou”.

Alice estava deslumbrante. Vestia um lindo vestido branco de gala, que fazia sua pele negra brilhar ainda mais. Seu cabelo estava lindamente ornado em um penteado de época, e seu andar era o de uma realeza. Seria realmente uma entrada de alguém de alto calibre, se não fosse por um detalhe: o furor que faziam era contra ela, afinal era uma não-ariana frequentando um lugar onde apenas a mais alta classe austríaca frequentava.

“Querida!”, disse Max, dando o braço pra Alice, “Você está linda, como sempre. Venha, vamos indo”. Na hora que todos viram que aquela linda mulher negra estava acompanhada de um dos maiores figurões empresariais da Alemanha, grande parte dos cochichos pararam, mas as pessoas continuavam a atacar com olhares de desprezo contra Alice Briegel, pelo simples fato de ser negra.

Briegel olhava pra Max e via o quanto ele protegia Alice. Era realmente um homem digno da sua bênção matrimonial, nunca teve dúvida disso. Mesmo no meio da Europa dominada pelo nazismo, Max era um alemão louro que não tinha vergonha alguma de andar junto com sua esposa negra, africana. Alice era uma pessoa forte, que nunca duvidou de si mesma, nem da capacidade de andar com suas próprias pernas. Mas desde que encontrou Max, parecia que ela havia encontrado também um fiel guardião. Não um homem pra ser maior que ela, ou mandar nela. Mas um parceiro, pra andar ao lado dela, da mesma forma que os dois andavam com os braços entrelaçados. O casamento não havia tirado o principal: eles pareciam um lindo casal de namorados.

“É a minha filha. Ela é linda, não?”, Briegel pensou em voz alta, e Alice ao vê-lo de longe, mesmo sem ouvir exatamente o que seu pai dizia, deu um tchauzinho e um sorriso.

“É verdade, ela já é linda, hoje então está deslumbrante!”.

Briegel se virou pra saber quem era a pessoa do seu lado e tomou um susto. Era Liesl, também, com uma elegante vestido azul claro de gala, um lindo coque no topo da cabeça, muito bem maquiada e perfumada. Briegel ao vê-la ao seu lado tomou um susto. Liesl havia crescido, e embora pra Briegel ela continuasse uma criança na sua mente, com toda aquela beleza de uma donzela praticamente adulta, era difícil continuar com essa convicção. Foi meio chocante, na verdade.

“Liesl! Minha nossa, você está tão linda quanto a Alice!”, disse Briegel, altivamente.

Liesl ficou completamente vermelha. Aquele elogio, vindo do homem que ela mais amava havia preenchido seu coração até transbordar. Ela simplesmente derreteu por dentro, mas por fora estava completamente paralisada.

“Liesl? Tudo bem?”, disse Briegel, tirando Liesl do seu transe.

“Ah! Perdão, coronel. Isso tudo foi a Alice”, disse Liesl, apontando para si mesma, “Ela disse que não dava pra só ela ir produzida, e disse que eu devia me produzir também”, nessa hora ela parecia meio atrapalhada, pois nunca havia se vestido como uma mulher até então, “Essas roupas são estranhas, parece que atrapalham meus movimentos...”.

Briegel deu risada.

“Acho que você nunca se vestiu a caráter, não?”, disse Briegel.

“Não...”, disse Liesl, sem jeito.

“Nessas horas fico abismado na linda mulher que você se tornou. Sem dúvida você teria homens e mais homens suspirando aos seus pés se estivessem vendo o que eu vejo!”, disse Briegel, sorrindo, como se fosse um pai orgulhoso de Liesl.

Mas só existe um homem que eu realmente amo, pensou Liesl, sorrindo, agradecendo balançando a cabeça pro elogio de Briegel.

Por um momento quando Briegel a elogiou quando a viu ela vislumbrou que poderia haver um sentimento recíproco. Que Briegel a via não mais como sua aprendiz, mas como uma mulher, que isso poderia despertar sentimentos de vê-la como sua parceira, não como sua pupila. Mas a última fala de Briegel soava mais como um elogio de um pai para uma filha, e isso foi como ir da extrema felicidade à máxima frustração.

“Coronel, obrigada pelos elogios”, disse Liesl, voltando ao foco da missão, “Dei uma volta no salão de apostas, e acho que vi Ursel Meyer jogando”, disse Liesl.

“Oh, você é a melhor assistente do mundo mesmo, que rápida! Sim, vamos lá então. A senhora que manda”, disse Briegel, pedindo pra ela ir na frente. Liesl deu um sorrisinho.

Então eles começaram a caminhar pelo salão. Liesl foi na frente, e Briegel foi logo atrás dela. O alemão se sentia feliz e confiava nela. Liesl sempre se mostrou muito além de qualquer expectativa. Sempre um passo à frente. E Briegel muitas vezes via que treiná-la para ser uma agente da Inteligência foi apenas como uma ferramenta – a aptidão era algo natural de Liesl, e mesmo se Briegel fosse qualquer coisa, com certeza Liesl seria tão boa quanto ele. E isso o dava muito orgulho.

“Ali, coronel. Na mesa da direita”, disse Liesl. Briegel agradeceu balançando a cabeça e olhou. Era uma mesa de apostas de póquer, bem no estilo dos filmes de James Bond, o agente que sequer existia na década de 30. Ursel Meyer com cartas na mão viu ao longe Briegel e assentiu com a cabeça. Mas havia alguém do lado dela, e quando Briegel viu quem era, ficou pálido.

“Coronel?”, chamou Liesl, mas Briegel sequer piscou, “Coronel? O senhor tá me ouvindo?”, perguntou Liesl sem entender.

“Não é possível...”, pausou Briegel, depois de voltar do susto de quem viu ao lado de Meyer, “...Quem está do lado da Ursel é o meu pai!”.

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