Doppelgänger - #56 - Sentado no banheiro.

“Senhor, é o próximo ponto”, disse o motorista.

Nataku desceu depois de uma viagem de quase duas horas, e várias conduções. Vira que havia uma estação de trem londrino ali perto, talvez teria sido mais fácil ter usado aquela opção. Estava em Surrey, dentro da área metropolitana de Londres, ao sul da cidade. Só haviam casas e mais casas, um bairro totalmente residencial, de luxo. Nas casas haviam Porsches, Lamborghinis e Lotus. Um local dos grã-finos ingleses.

Ao chegar no endereço que Saunders havia passado, vira que dentro da garagem havia um Koenigsegg Agera R. Nada menos que um dos carros mais potentes e caros do mundo. Saunders poderia ser quem fosse, mas tinha um excelente gosto, mesmo com todo esse dinheiro.

Ao se aproximar da porta, viu que já tinham pessoas lá dentro.

Um deles, era Rockefeller.

“Nataku! Você foi rápido, nos pegou de surpresa. Como está?”, perguntou Rockefeller.

“Rockefeller, o que você está fazendo aqui?”, perguntou Nataku.

“Viemos conferir o tal endereço que Saunders te passou. Que casarão! Estamos revirando tudo em busca de pistas... Mas não achamos nada. Nem mesmo uma passagem secreta, nem nenhum código, nada”, disse Rockefeller.

Por um momento Nataku pensou como eles foram tão rápidos. Deveria ter alguma escuta nele, ou algo assim, só esperando a revelação de Saunders para que todos fossem atrás das informações que ela tinha.

“Procuramos no banheiro também, e nada. Reviramos tudo”, disse Rockefeller.

“Banheiro? Porque alguém deixaria tais informações no banheiro?”, perguntou Nataku.

“Mas foi isso que ela falou pra você antes de dizer o endereço, não lembra? ‘Você vai encontrar pistas, sentado no banheiro’. Mas não achamos nada, nem um papel, nem um memorando, absolutamente nada. Isso significa algo pra você?”, disse Rockefeller.

“Não...”, disse Nataku, cabisbaixo, relembrando a agonia da morte de Saunders, “...Não significa nada pra mim. Quer dizer que vocês estavam com uma escuta em mim?”.

“Não pense que desconfiamos de você, Nataku. Essa mulher era uma ameaça grande para nosso sucesso, para os planos do Ar. E muitos ouvidos memorizam melhor que um. Digamos que isso foi... Pra termos certeza que tudo ia dar certo”, disse Rockefeller.

Rockefeller e os homens de Ar ficaram revirando a casa por dez minutos ainda. Levaram alguns objetos, mas nada que parecesse despertar interesse, que fosse conclusivo.

“Eu vou ficar mais um pouco. Pode ser que eu descubra algo”, disse Nataku.

“Sem problemas. Não se esqueça de falar alto, que estamos ouvindo você e viremos na hora”, disse Rockefeller.

“Sim”.

Depois de cinco minutos que eles saíram, Nataku tirou toda sua roupa. Talvez o microfone seria muito pequeno, ou talvez até fossem mais de um. Colocou as calças, carteira, tudo na lavadeira. Ligou e enxaguou toda a sua roupa, passando no secador de roupas da senhora Saunders depois.

Se tinha algum microfone, com toda essa água, dificilmente vai funcionar, pensou Nataku.

Com as roupas secas, vestiu e começou a andar pela sala. Viu um computador, telefone, vários papéis com recados, uma estante de livros e o tal banheiro.

Ao entrar no banheiro também abriu os armários e gavetas e nada encontrou.

Mas ela disse ‘sentado no banheiro’. Alguém tentou sentar?, pensou Nataku.

Nataku sentou na privada. Tudo o que ele via era a porta fechada, de madeira. Passou a mão na porta e viu que naquela altura conseguia sentir um relevo, impossível de se ver, mas que dava pra sentir com a mão. Se apressou em direção da sala, pegou um papel, um lápis, e passou por cima do baixo relevo pra saber o que era. Estava escrito “INITIALS”.

Iniciais? Iniciais de quem? Sheryl Saunders? SS?, pensou Nataku.

O primeiro local óbvio que ele buscou foi nas muitas estantes de livros que Saunders tinha na casa. Viu que de fato estava organizado em ordem alfabética, e havia uma prateleira com as iniciais “SS”. Ele revirou todos os livros, mas nada de concreto encontrou.

Pensa, pensa... Iniciais? Deixa eu colocar no papel... Só não entendo isso de “sentar no banheiro”. E o que iniciais tem a ver com sentado no banheiro? Exceto se... Será que é tão óbvio?, pensou Nataku.

Ele escreveu no papel “Sentado no banheiro” em inglês, e reparou algo:

SAT
ON
THE
TOILET

SOTT... Bom, é uma opção. Vamos ver se na estante tem algo, pensou Nataku.

Logo abaixo da prateleira “SS” havia “SOTT”. Eram todos livros iguais, pareciam enciclopédias. Ao abrir um deles vira que um papel caiu. Sem dúvida a dama da sorte estava do seu lado.

Um telefone? É o mesmo que a Saunders me passou lá em Vauxhall... E as iniciais SOTT. E do outro lado tem uma senha... “Thatcher is a slut”. Thatcher é uma vadia? Bom... O telefone está ali. Não custa nada tentar, pensou Nataku.

E ele discou o telefone. Enquanto chamava sentia seu rosto suar de preocupação. Seu coração disparava a cada toque. No quinto toque, alguém atendeu.

“SOTT falando. Qual a senha?”, a voz perguntou.

“Thatcher is a slut”, Nataku disse.

“Puxa... Então a número dezessete morreu mesmo. Mas se confiou em você o que ela sabe, nós confiaremos também. Seja bem vindo ao Sat on the toilet. Somos um grupo de insiders independente, ninguém conhece a outra pessoa aqui, apenas trocamos a informações entre nós. E você será o número dezessete. Eu sou o número nove, muito prazer”, disse a atendente.

“Isso parece piada... Porque diabos esse nome? Sat on the Toilet?”, perguntou Nataku.

“Somos insiders. Mas o nome veio inspirado na pessoa que enquanto está sentada no banheiro ouve a conversa das pessoas que vão ao toalete, mas ninguém nem imagina que essa pessoa está lá, ouvindo, mesmo sem querer. Porque no fundo é isso que nós fazemos. Apenas ouvimos o que os governos, agentes, terroristas e criminosos falam. Mas eles não imaginam que nós existimos. Vamos dizer que somos um grupo de fofoqueiros profissionais”.

“Certo. E em que vocês podem me ajudar?”, perguntou Nataku.

“A número dezessete deixou já separado alguns dados que ela deixou para o eventual sucessor. Nós guardamos uns os dados dos outros. Mas muitas das coisas guardamos na memória mesmo. Eu posso contar tudo o que a dezessete sabia. Está pronto pra ouvir?”, disse a atendente.

“Sim”, respondeu Nataku.

“Então é melhor você se sentar”.

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