Amber #11 - Why can't you hold me in the street, or kiss me on the dancefloor?
22 de abril de 1937
01h20
Briegel estava num vagão de carga encostado no portão levemente aberto observando as luzes da noite ao longe enquanto o trem rasgava por dentro da França, indo em direção à Espanha a toda velocidade. Não era o vagão de carga onde estavam as armas, e o trem era imenso, com muitos vagões tanto na frente quanto atrás deles. Mas as armas ali eram o de menos. Alice, sua filha, estava sendo mantida em algum lugar ali.
“Coronel? O senhor não vai dormir?”, perguntou uma voz masculina, ao lado de Briegel.
Briegel tomou um susto. Não tinha tido muito a chance de ouvir a voz de Goldberg, por conta da timidez dele. Mas naquele momento o jovem havia tomado a iniciativa, vendo Briegel ali naquela brecha olhando para o movimento ao longe.
“Me desculpa, Goldberg”, disse Briegel, mas depois viu que não havia motivo pra pedir desculpas ao Goldberg. Na verdade deveria agradecer, pois o jovem estava preocupado com ele. Briegel viu atrás dele que Sundermann estava encostado numa parede e dormindo, exausto depois do dia longo, “Na verdade, obrigado pela sua preocupação. Mas não consigo dormir. Minha filha é tudo o que eu tenho, e ela está em algum lugar desse trem imenso, e nem sabemos onde está o Sarkin”.
“Mas o senhor Schultz foi atrás dele, não?”, perguntou Goldberg.
“Verdade. Já tem quase uma hora e nada dele ainda. Espero que ele não tenha sido pego pelo Sarkin. Perder o Schultz nesse momento não iria ajudar em nada. Acho que vou lá atrás dele. Você fica aqui com o Sundermann?”, perguntou Briegel.
“Sim. Eu entendo bem o que o senhor sente pela sua filha. O Lars também é tudo o que eu tenho na minha vida. Nem consigo imaginar perder ele, que é a pessoa que eu mais amo”, disse Goldberg.
“É muito bonito esse sentimento que você tem por ele. Já é difícil ser homossexual. Deve ser mais difícil ainda com a sociedade apontando o dedo dizendo que vocês são máquinas de sexo promíscuas e sem sentimento uns pelos outros, não é mesmo?”, perguntou Briegel.
Goldberg virou o rosto e olhou pra Sundermann deitado. Seus olhos encheram de lágrimas.
“É verdade. Sabe, coronel Briegel, a gente não escolhe ser homossexual. Não é uma ‘opção’ como se fosse uma escolha. Simplesmente nascemos assim. O que me dá mais medo é descobrirem a gente, sabe? Sei que o Lars é completamente fiel ao Führer e aos ideais nazistas. Mas será que ele não entende a ambiguidade disso tudo? Ele apoia um regime que claramente quer a morte de homossexuais como a gente. E sei que nós seríamos mortos se descobrissem sobre a gente. É muito triste poder amar alguém sem poder andar de mãos dadas na rua, ou trocarmos carícias em parques, fingindo ser o que não somos. Eu queria fugir com ele, mas ele não quer, ele é tão fiel ao Hitler…”, desabafou Goldberg.
Nessa hora Briegel colocou a mão no ombro dele.
“Olha, pode ter certeza que eu não irei delatar vocês pra ninguém. Nunca. Todos nós somos alemães, e nós só queremos nosso país de volta, com liberdade para todos. Talvez o Sundermann seja essa pessoa que tem o coração dividido. De um lado a lealdade ao Hitler, e do outro lado o amor por você. Talvez hoje a lealdade ao Hitler seja um pouco maior que o amor dele por você. Mas mudar isso está apenas em suas mãos”, disse Briegel.
“Em minhas mãos…?”, perguntou Goldberg.
“Isso! Ele não vai diminuir a lealdade ao Terceiro Reich. Mas o amor por você pode aumentar, você tem essa vantagem. Resta você se empenhar nisso e reverter para o seu bem. Se você fizer com que ele te ame e te coloque como prioridade maior até mesmo que a lealdade ao Hitler, não terá limites para esse amor. Depende apenas de você roubar esse espaço no coração dele”, disse Briegel.
Nessa hora Goldberg abraçou Briegel, chorando de felicidade.
“Obrigado, coronel Briegel. O senhor me deu esperanças de ser feliz!”, disse Goldberg, “Muito obrigado mesmo!”.
------
Briegel começou a andar pelos vagões em busca de Schultz. Goldberg e Sundermann pareciam cansados, ficaram por lá mesmo. Tomando o máximo de cuidado pra evitar que Sarkin eventualmente o veja, Briegel foi avançando de vagão em vagão. Já era madrugada, e todos dormiam.
O Sarkin é esperto, deve ter escondido a Alice em algum lugar, não necessariamente no vagão de carga. O problema é que ele não sabe que estamos aqui, ele tentou nos despistar na estação central do Munique. Temos que encontrar ele antes dele saber que estamos aqui, pois se ele souber que estamos aqui a Alice corre perigo também. O Schultz foi atrás disso, preciso encontrar ele logo, pensou Briegel.
Em um dos vagões dormitório Briegel ouviu uns urros masculinos e uns gemidos femininos. Devia ser um casal fazendo sexo. Mas aquela voz era familiar pra ele de algum lugar. Os urros terminaram, mas ainda era possível ouvir que estavam arfando, recuperando o ar.
“Ah, nossa, como você é gostosa, cacete!”, disse a voz masculina, em francês.
Nessa hora Briegel abriu a porta com tudo, que estava destrancada.
“SCHULTZ!!”, gritou Briegel, “Isso é hora de estar trepando com alguém?”
Era Schultz, deitado nu ao lado de uma mulher, também nua. Parecia que eles tinham acabado de chegar ao orgasmo, e Briegel abriu a porta na hora exata. A cara de Schultz era impagável, o sorriso mais sem graça do universo.
“Schultz? Ele tá falando alemão! Você não disse que o seu nome era Édouard?”, disse a moça, em francês.
“Ah, Josephine, foi um prazer imenso, e pelos seus gemidos foi um prazer imenso pra você também, mas isso, gatinha, é uma longa estória”, disse Schultz, em francês, se levantando e colocando suas roupas, “Mas pode deixar que peguei seu telefone e vou te ligar assim que chegar na Espanha, gatinha! Mal vejo a hora de termos um repeteco!”, Schultz mandou um beijinho e saiu do quarto seguindo Briegel.
“E aí, o que descobriu?”, perguntou Briegel.
“Mulheres são as melhores pra achar informações, elas sempre têm bons ouvidos!”, disse Schultz, amassando o papel com telefone dela e jogando pela janela, “Então, a antes dessa tinha os dentes meio tortos, mas os mamilos durinhos. E ela disse que esse trem está indo pra Espanha. Não era o trajeto que estava escrito, não vamos parar na França!”.
Briegel nessa hora suou frio. A França e o Reino Unido estavam juntas num embargo de armas e soldados que vinham da Alemanha pra Espanha. O motivo disso é o apoio militar que a Alemanha nazista estava dando aos revolucionários de Francisco Franco, pra dar um golpe de estado na Espanha. Com certeza o trem seria parado e confiscariam tudo. Será que Sarkin estava pronto para subornar os oficiais espanhóis pra entrar com o armamento para os golpistas?
“Merda. E se acharem a Alice? Se descobrirem que ela é alemã vão matá-la sem hesitar! A gente não tem escolha, temos que encontrar Sarkin!”, disse Briegel.
“Coronel, calma!”, disse Schultz, acalmando o amigo, “Sei que você está tenso e preocupado, eu também estou na mesma situação que você. Mas se sairmos por aí essa hora atrás do Sarkin a chance dele estar um passo na nossa frente é muito maior!”
“E o que você sugere então, Schultz?”, perguntou Briegel.
“Eu tenho um plano”, disse Schultz.
01h20
Briegel estava num vagão de carga encostado no portão levemente aberto observando as luzes da noite ao longe enquanto o trem rasgava por dentro da França, indo em direção à Espanha a toda velocidade. Não era o vagão de carga onde estavam as armas, e o trem era imenso, com muitos vagões tanto na frente quanto atrás deles. Mas as armas ali eram o de menos. Alice, sua filha, estava sendo mantida em algum lugar ali.
“Coronel? O senhor não vai dormir?”, perguntou uma voz masculina, ao lado de Briegel.
Briegel tomou um susto. Não tinha tido muito a chance de ouvir a voz de Goldberg, por conta da timidez dele. Mas naquele momento o jovem havia tomado a iniciativa, vendo Briegel ali naquela brecha olhando para o movimento ao longe.
“Me desculpa, Goldberg”, disse Briegel, mas depois viu que não havia motivo pra pedir desculpas ao Goldberg. Na verdade deveria agradecer, pois o jovem estava preocupado com ele. Briegel viu atrás dele que Sundermann estava encostado numa parede e dormindo, exausto depois do dia longo, “Na verdade, obrigado pela sua preocupação. Mas não consigo dormir. Minha filha é tudo o que eu tenho, e ela está em algum lugar desse trem imenso, e nem sabemos onde está o Sarkin”.
“Mas o senhor Schultz foi atrás dele, não?”, perguntou Goldberg.
“Verdade. Já tem quase uma hora e nada dele ainda. Espero que ele não tenha sido pego pelo Sarkin. Perder o Schultz nesse momento não iria ajudar em nada. Acho que vou lá atrás dele. Você fica aqui com o Sundermann?”, perguntou Briegel.
“Sim. Eu entendo bem o que o senhor sente pela sua filha. O Lars também é tudo o que eu tenho na minha vida. Nem consigo imaginar perder ele, que é a pessoa que eu mais amo”, disse Goldberg.
“É muito bonito esse sentimento que você tem por ele. Já é difícil ser homossexual. Deve ser mais difícil ainda com a sociedade apontando o dedo dizendo que vocês são máquinas de sexo promíscuas e sem sentimento uns pelos outros, não é mesmo?”, perguntou Briegel.
Goldberg virou o rosto e olhou pra Sundermann deitado. Seus olhos encheram de lágrimas.
“É verdade. Sabe, coronel Briegel, a gente não escolhe ser homossexual. Não é uma ‘opção’ como se fosse uma escolha. Simplesmente nascemos assim. O que me dá mais medo é descobrirem a gente, sabe? Sei que o Lars é completamente fiel ao Führer e aos ideais nazistas. Mas será que ele não entende a ambiguidade disso tudo? Ele apoia um regime que claramente quer a morte de homossexuais como a gente. E sei que nós seríamos mortos se descobrissem sobre a gente. É muito triste poder amar alguém sem poder andar de mãos dadas na rua, ou trocarmos carícias em parques, fingindo ser o que não somos. Eu queria fugir com ele, mas ele não quer, ele é tão fiel ao Hitler…”, desabafou Goldberg.
Nessa hora Briegel colocou a mão no ombro dele.
“Olha, pode ter certeza que eu não irei delatar vocês pra ninguém. Nunca. Todos nós somos alemães, e nós só queremos nosso país de volta, com liberdade para todos. Talvez o Sundermann seja essa pessoa que tem o coração dividido. De um lado a lealdade ao Hitler, e do outro lado o amor por você. Talvez hoje a lealdade ao Hitler seja um pouco maior que o amor dele por você. Mas mudar isso está apenas em suas mãos”, disse Briegel.
“Em minhas mãos…?”, perguntou Goldberg.
“Isso! Ele não vai diminuir a lealdade ao Terceiro Reich. Mas o amor por você pode aumentar, você tem essa vantagem. Resta você se empenhar nisso e reverter para o seu bem. Se você fizer com que ele te ame e te coloque como prioridade maior até mesmo que a lealdade ao Hitler, não terá limites para esse amor. Depende apenas de você roubar esse espaço no coração dele”, disse Briegel.
Nessa hora Goldberg abraçou Briegel, chorando de felicidade.
“Obrigado, coronel Briegel. O senhor me deu esperanças de ser feliz!”, disse Goldberg, “Muito obrigado mesmo!”.
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Briegel começou a andar pelos vagões em busca de Schultz. Goldberg e Sundermann pareciam cansados, ficaram por lá mesmo. Tomando o máximo de cuidado pra evitar que Sarkin eventualmente o veja, Briegel foi avançando de vagão em vagão. Já era madrugada, e todos dormiam.
O Sarkin é esperto, deve ter escondido a Alice em algum lugar, não necessariamente no vagão de carga. O problema é que ele não sabe que estamos aqui, ele tentou nos despistar na estação central do Munique. Temos que encontrar ele antes dele saber que estamos aqui, pois se ele souber que estamos aqui a Alice corre perigo também. O Schultz foi atrás disso, preciso encontrar ele logo, pensou Briegel.
Em um dos vagões dormitório Briegel ouviu uns urros masculinos e uns gemidos femininos. Devia ser um casal fazendo sexo. Mas aquela voz era familiar pra ele de algum lugar. Os urros terminaram, mas ainda era possível ouvir que estavam arfando, recuperando o ar.
“Ah, nossa, como você é gostosa, cacete!”, disse a voz masculina, em francês.
Nessa hora Briegel abriu a porta com tudo, que estava destrancada.
“SCHULTZ!!”, gritou Briegel, “Isso é hora de estar trepando com alguém?”
Era Schultz, deitado nu ao lado de uma mulher, também nua. Parecia que eles tinham acabado de chegar ao orgasmo, e Briegel abriu a porta na hora exata. A cara de Schultz era impagável, o sorriso mais sem graça do universo.
“Schultz? Ele tá falando alemão! Você não disse que o seu nome era Édouard?”, disse a moça, em francês.
“Ah, Josephine, foi um prazer imenso, e pelos seus gemidos foi um prazer imenso pra você também, mas isso, gatinha, é uma longa estória”, disse Schultz, em francês, se levantando e colocando suas roupas, “Mas pode deixar que peguei seu telefone e vou te ligar assim que chegar na Espanha, gatinha! Mal vejo a hora de termos um repeteco!”, Schultz mandou um beijinho e saiu do quarto seguindo Briegel.
“E aí, o que descobriu?”, perguntou Briegel.
“Mulheres são as melhores pra achar informações, elas sempre têm bons ouvidos!”, disse Schultz, amassando o papel com telefone dela e jogando pela janela, “Então, a antes dessa tinha os dentes meio tortos, mas os mamilos durinhos. E ela disse que esse trem está indo pra Espanha. Não era o trajeto que estava escrito, não vamos parar na França!”.
Briegel nessa hora suou frio. A França e o Reino Unido estavam juntas num embargo de armas e soldados que vinham da Alemanha pra Espanha. O motivo disso é o apoio militar que a Alemanha nazista estava dando aos revolucionários de Francisco Franco, pra dar um golpe de estado na Espanha. Com certeza o trem seria parado e confiscariam tudo. Será que Sarkin estava pronto para subornar os oficiais espanhóis pra entrar com o armamento para os golpistas?
“Merda. E se acharem a Alice? Se descobrirem que ela é alemã vão matá-la sem hesitar! A gente não tem escolha, temos que encontrar Sarkin!”, disse Briegel.
“Coronel, calma!”, disse Schultz, acalmando o amigo, “Sei que você está tenso e preocupado, eu também estou na mesma situação que você. Mas se sairmos por aí essa hora atrás do Sarkin a chance dele estar um passo na nossa frente é muito maior!”
“E o que você sugere então, Schultz?”, perguntou Briegel.
“Eu tenho um plano”, disse Schultz.
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