Livros 2024 #12 - Estou feliz que minha mãe morreu (2022)
Com o surgimento das denúncias dos abusos sofridos pelos atores mirins no set de gravações das séries da Nickelodeon, fui atrás do livro da Jennette McCurdy, a Sam de iCarly, para saber mais sobre. Embora eu já estivesse crescido quando assisti iCarly, achava a série divertida, se tivesse filhos com certeza aprovaria para que assistissem. Mas conforme as denúncias de pedofilia de Dan Schneider, o criador das séries, vieram à tona, não consigo mais olhar para elas da mesma maneira.
Jennette McCurdy não é uma excelente escritora, mas sem dúvidas tem uma excelente história para contar. Apesar de eu ter adquirido o livro para saber das histórias acerca do criador da série, como o próprio nome do livro indica, ele foca na relação conturbada que a atriz tinha com sua mãe, Debra McCurdy.
— Sinceramente, Net, eu não só poderia ter casado com um desses homens como eu deveria. Eu estava destinada à vida boa. A ter fama e fortuna. Você sabe o quanto eu queria ser atriz. — Mas a vovó e o vovô não deixaram. — completo. — Mas a vovó e o vovô não deixaram. Exatamente.
Debra era uma mãe que era deslumbrada pela fama, e em especial em fazer, a todo custo, sua filha Jennette ser uma grande atriz do showbis. A trajetória da Jennette me lembra muito a do Michael Jackson — e em ambos os casos o resultado foi muito bom, pois ela é uma excelente atriz também. Mas toda essa fama veio com muito custo. Debra sempre fora uma mãe muito manipuladora, tomando decisões sem consultar a filha, e até dando banho na Jennette até a adolescência. Isso sem contar a vida de manipulação emocional, e a filha constantemente buscando a aprovação da mãe.
E em meio a esses abusos, Debra queria que Jennette sempre estivesse dentro de um peso ideal, e por isso desde cedo submeteu a filha a um rigoroso controle alimentar, de redução de calorias. E uma vez que ela era uma criança, afetou no desenvolvimento da própria atriz, que mesmo sendo uma adolescente na época, ainda tinha traços e altura de uma criança (hoje ela tem 1,57m). Sem uma alimentação apropriada, e sempre exagerando nos exercícios físicos, uma hora isso tudo não funcionaria, pois o corpo dela se desenvolveria da mesma forma.
Ela diz que meus cílios são longos, mas tão claros que parece que não tenho nenhum. Diz que meu cabelo tem mechas douradas, mas apenas nas pontas e que é importante que também tenha mechas douradas em volta do rosto, para emoldurá-lo. Ela diz que meu cabelo é bem grosso, o que é bom, mas que tem vida própria, o que é ruim, e precisa ser domado. Diz que eu tenho um bom sorriso, mas meus dentes não são brancos o suficiente. Cada coisa “boa” que afirma sobre minha “beleza natural” é acompanhada de um aspecto negativo, que serve como justificativa para a necessidade de realçá-la com um pouco da boa e velha beleza comprada.
E então o drama dela aumenta, e ela se torna bulímica (engolir a comida e depois vomitar). Tudo isso para chegar no peso ideal que a mãe dela queria — que era a constituição física de uma criança, para continuar ganhando papéis nas séries e filmes, mas ignorando que o tempo estava passando e ela tinha que amadurecer.
A obsessão da mãe de Jennette para que a filha fosse para sempre uma criança é assustador. Isso me lembra muito a do já falecido Gary Coleman, o Arnold da série homônima (Diff'rent strokes, no original). E como se desgraça pouca fosse bobagem, Debra ainda lutava contra um agressivo câncer, que se iniciou nas mamas, e é exatamente ele que termina por tirar sua vida. Quanto sofrimento, coitada!
A parte sobre o Dan Schneider é bem curiosa, pois parece que de alguma forma o elenco de iCarly foi meio protegido de ser alvo de estupros, uma coisa que infelizmente a Amanda Bynes e Drake Bell não tiveram a mesma sorte, embora muitas das crianças que eram alvo de abusadores dentro do set de filmagens da Nickelodeon ainda estejam de silêncio. Entre os em silêncio até hoje temos Victoria Justice, Liz Gillies, Miranda Cosgrove, e até Ariana Grande.
Perguntei se poderia, por favor, experimentar apenas maiôs com bermudas por cima, o jeito com que me sinto mais confortável em um traje de banho. Coberta. Mas nossa figurinista disse que O Criador pediu explicitamente por biquínis.
Vi em alguns canais de fofoca no Youtube que quem protegia as crianças era o Jerry Trainor, o Spencer de iCarly. Tem fotos, e até vídeos dele entrando na frente quando o Dan Schneider tentava ficar sozinho com as crianças, impedindo que eventualmente abusos sexuais acontecessem ali. Os abusos que Jennette sofreu foram de ordem profissional, por meio de berros, humilhações públicas, embaraços, e muita chantagem.
Depois da morte da mãe, Jennette entra em uma espiral de depressão muito forte. Além da bulimia piorar, ela se torna alcoólatra, e se envolve em diversos relacionamentos tóxicos com homens. Todos os personagens do livro ela troca de nome, mas com uma simples googlada a gente descobre os nomes reais, como o "Joe" e "Steven" do livro sendo Paul Glaser & Jesse Carere, respectivamente.
Apesar de todo o sofrimento, o livro termina com um capítulo super bem escrito onde ela faz um balanço da conturbada vida com a mãe, já com um olhar bem mais maduro, tentando dar sentido a tudo aquilo que ela viveu. Jennette hoje abandonou a carreira de atriz e cantora, e se dedica em um podcast, além de ser escritora e diretora cinematográfica.
Infelizmente a gente sabe como funciona Hollywood, e talvez Jennette nunca conseguirá seguir na carreira, uma vez que teve o nome envolvido em tantas polêmicas. Uma pena, pois ela sempre mostrou um grande talento em tudo o que sempre fez, e tenho certeza que teria o mesmo êxito em qualquer outra área que tentasse. Espero que ela consiga encontrar sua felicidade mais uma vez. Na vida infelizmente ter sorte ás vezes conta mais do que todo o esforço e talento do mundo, e nesse quesito, Jennette acabou encarando coisas tão horríveis que é difícil mensurar o quanto de sofrimento ela passou.
Fique bem, Sam Puckett.
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