Overture - Epílogo - Aquele que se vai.

Telegrama. Uma tecnologia tão avançada, ágil, certeira, ainda guardava ainda o que as cartas de papel tinham: a habilidade de enviar-se uma mensagem com saudosismo, carregando um ar tradicional.

Al havia chegado tarde em casa naquele dia. Abrira sua antiga caixa de correspondência e se espantara com o que via. Era Schultz, chamando-o para visitá-lo urgentemente. Temendo ser alguma doença ou algo grave, Al pegou o primeiro vôo até lá.

Chegando lá, sr. Schultz estava sentado na cama, de pijamas, fumando um cigarro. Ele olhava pra janela, e não percebera que Al adentrava ao recinto. Seus olhos estavam cansados, as baforadas saiam lentamente de sua boca. Foi então que ele virou-se para apagar o cigarro e viu que Al chegara.

"Oh! Você chegou. Por favor, sente-se. Vou pedir pra lhe trazerem um café", ele disse.

"Senhor... Pensei que estivesse pior. Mas está bem, não está em nenhum hospital, e consegue ainda conversar comigo...", Al disse, de uma forma um pouco aflita.

O velho Schultz deu um pequeno riso e olhou pra Al. Ninguém nunca vira o velho sequer esboçar um sorriso, por menor que seja. E naquele momento lá estava ele, naquela altura da vida, quebrado aquela seriedade e seu protocolo impecáveis.

"Al, meu caro Al... Eu vou morrer, desse ano eu não passarei. A idade está pesando demais nas minhas costas, já vi muitas coisas na minha vida, e sinto que o fim está muito próximo. Devo dizer que estou feliz por um lado, e triste por outro", ele iniciou.

"Feliz? O senhor não devia estar pensando nisso. Está bem, está com saúde, viverá ainda por mais alguns anos, com certeza!", Al disse, tentando reanimá-lo.

"Não, Al. Por um lado estou feliz por ver que enfim sairei dessa vida maldita e ingrata. Viver é difícil, Al. Os filmes adoram nos mostrar que é fácil, mas é algo muito complicado. Nossa vida dá reviravoltas, muda muito, nunca sabemos o que virá e, muitas vezes, algumas consequências de nossos atos fogem da nossa realidade, e ficamos pagando pelo resto de nossas vidas", Schultz prosseguiu.

Al ficou quieto, apenas ouvindo. Schultz prosseguiu, como num monólogo:

"Lembro como se fosse ontem. Eu ia me aposentar naquela época, mas os podres da Yard não me deixaram em paz e me apresentaram um cara que era um prodígio da geração. Eles me tratavam como uma lenda. Esse prodígio era seu irmão mais velho. Minha esposa pediu pra eu me aposentar, mas ao vê-lo eu decidi que queria continuar. Ela se divorciou de mim, levou minhas filhas, minhas netas. Seu irmão foi como um filho pra mim, eu o ensinei tudo..."

"...E eu, que era apenas a 'lenda', nada era perto do seu irmão, que foi uma 'lenda viva'. Perspicaz, inteligente, sagaz, rápido, imbatível e perfeito. Gostaria que você fosse pra mim como seu irmão foi, mas é complicado. Arch foi o erro mais correto que cometi na minha vida. E quando ele foi traído e morto daquele jeito eu..."

Schultz lacrimejou. Pausou por alguns segundos, se recompôs, prosseguiu:

"Eu morri junto. E não pude fazer nada, pois era um velho, um velho jogado de lado chamado de caduco. Al, quantos anos você tem?", Schultz perguntou.

"D-dezessete, senhor", Al respondeu.

"Case-se, Al. Ache uma boa esposa, não precisa ser bonita, ela tem que ser alguém bondosa. Evite as francesas, tente uma hispânica, elas todas têm bons seios. Eu sei que essa vida é tentadora, mas esses caras do governo te excluem na primeira oportunidade. Ser um fantoche deles é demais."

"Procure a senhora Elisabeth, ela te protegerá. A velha ainda aguentará uns bons anos, e siga sua vida. Esqueça o que Émilie fez, se ela estava a um passo na frente do seu irmão, ela está a dois de você. Não busque vingança e não jogue tudo o que você tem pela janela".

A sala ficou em silêncio por um minuto. Al olhou pra baixo, curvou as sobrancelhas de raiva e disse:

"Senhor, não posso prometer isso. Eu quero a cabeça da Émilie! Não vou descansar enquanto...", Schultz o segurou pelos ombros, olhou nos olhos e disse num tom ainda mais alto para Al:

"Você... Você ainda tem sua juventude! Não jogue-a no lixo! Você provavelmente irá passar anos atrás dela e nunca conseguirá nada! Viva, Al. E longe de todos. Seja feliz! Você pode recomeçar a vida, já eu... Somente tenho que esperar a morte sentado".

No dia seguinte Al pegou um avião de volta. O admirável senhor Schultz faleceu algumas semanas depois, de causas naturais.

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