Eu e Siddartha. #3

Quando era moleque eu sempre tinha visões.

Ás vezes só de andar em locais eu via muitas coisas que quando eu colocava meus olhos eles sumiam. Crianças são seres muito inteligentes, muito mais inteligentes que nós adultos, e eu não era diferente (mesmo que muitos adultos me tratassem como um retardado por eu ser criança).

Sabia que ver aquilo numa família católica pelo lado do pai e evangélica pelo lado da mãe era errado. E eu nunca concordava muito com isso, pois era a clássica rivalidade do "eu estou certo e você está errado".

Por parte de pai, tinham muitas pessoas que eram mães de santo. A mais próxima era minha avó Benedita, uma médium muito forte. Dizem que ela queria fazer uma purificação em mim quando eu era bebê e minha mãe, já evangélica, fez abraçada comigo orando o nome de Jesus fortemente. Muitos na família do meu pai herdaram essa sensibilidade espiritual, mesmo que ela se mostre de diversas outras maneiras.

Já por parte de minha mãe, tinha muita gente forte espiritual também. Mas por serem evangélicos, mesmo que a essência e o conceito das visões fossem similares, por serem evangélicos era um "presente de Deus", enquanto o que era feito pelas mães de santo de parte do meu pai, mesmo similares, eram "coisas do demônio".

Por parte de mãe eu tinha uma bisavó que era completamente cega pela catarata, a vó Ana. Mas ela enxergava claramente espíritos. Uma das coisas que mais me deixava impressionado era quando ela via espíritos incompreendidos sendo levados na água para o esgoto. Eu não conseguia ver com tanta clareza, mas até hoje tenho muito medo de bueiros nas ruas. Vó Ana faleceu com mais de noventa anos, em 1994.

Eu tinha muitas premonições também. Eu previ a morte do meu avô Raimundo. Eu sabia que ele estava prestes pra morrer, e mesmo eu tendo apenas nove anos na época, lembro que quando minha avó veio até mim, chorando, e disse: "Alain, o seu avô Rai morreu", eu peguei e voltei a brincar com carrinhos, pois eu já sabia. Era sempre muito em sonhos também que vinham essas indicações. Quando minha avó veio dizer que o vô Rai havia morrido, provavelmente eu teria dito: "Mas isso eu já sabia".

Mas curiosamente esses seres nunca me fizeram nenhum mal indiretamente. Não sei o que acontecia, mas quando eu os via eles... sumiam, evaporavam. As visões continuaram (e continuam) até hoje. Mas sempre alternavam muito.

Lembro de que quando tinha uns 17 anos eu sempre via uma menina loira de cachinhos, correndo com um vestido branco e um laço azul na cintura na minha casa. Na época eu tinha muita depressão por conta do relacionamento difícil com meu pai na época.

Quando era criança tinha medo, especialmente dos que eu via no corredor da sala de casa. Sempre os via chegar até a porta, mas sem nunca conseguir abrir a maçaneta pra entrar no corredor - onde havia uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, uma foto do casamento dos pais do meu pai, e da Sônia, minha falecida tia, a primogênita da família do meu pai, morta com apenas oito anos.

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O Buda também quando era criança tinha muitas visões. Uma vez, durante um festival agrícola, o pequenino Siddartha entrou em meditação e enquanto via um passarinho comendo uma minhoca. Entrou em comunhão com os guardiões terrestres do darma e teve um insight sobre como o ciclo da transmigração existe.

Tudo o que nasce, deve morrer.

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