Amber - WORD UP! (4)
12 de setembro de 1933
“Oi Alice! Que cheiro bom! O que você fez hoje de almoço?”, perguntou Schultz, entrando na cozinha sem anunciar antes.
“Oi tio! Tá com fome? Eu fiz Sauerbraten pro almoço. Deu uma escapada do trabalho?”, perguntou Alice.
“Nossa, por isso tá cheirando tão bem! Sim, eu vim fazer um trabalho aqui perto, aí dei um pulo aqui pra almoçar. Nada como uma comidinha caseira!”, disse Schultz, pegando um prato e se aproximando da porcelana onde Alice colocou pra servir, “Nossa, deixou quanto tempo marinando isso no vinho? Eu tô babando aqui!”.
“Dez dias. Inteirinhos!”, disse Alice, servindo Schultz, “Vamos pra mesa comer. Vai ser ótimo ter sua companhia, tio! Quer cerveja?”.
Schultz estava com a boca cheia, mal conseguia falar.
“Nossa! Você cozinha comida alemã melhor que uma alemã, Alice. Você deve ser loira e usa carvão pra ficar dessa cor, só pode! Você devia abrir um restaurante!”, disse Schultz.
Nessa hora Alice riu.
“Quem sabe depois que Hitler deixar esse governo, pode até rolar! Enquanto ele está no poder vai ser difícil uma negra ter um restaurante, mesmo se for comida alemã”, disse Alice.
“Apenas ‘comida alemã’ não! Comida alemã da melhor qualidade!”, disse Schultz, bebendo um pouco de cerveja pra ajudar a comida descer, “Escuta, Alice, você não tem uma mãe não?”.
“Não”, disse Alice.
“O coronel não tem nem uma namorada?”, perguntou Schultz.
“Ele disse que não tem tempo pra isso. E de fato, ele trabalha muito, todos os dias, sem hora pra chegar. Acho que seria difícil mesmo pra ele entrar num relacionamento assim, tio. Dá pra entender o lado dele”, explicou Alice.
Schultz fez uma cara de quem estava pensando, enquanto mastigava e engolia a comida.
“Olha, tenho uma ideia! Eu conheço muitas gatinhas por aí. Posso tentar apresentar uma pro seu pai! Tenho certeza que vai rolar algo, vou dar umas dicas pra ele!”, disse Schultz, empolgado.
“Dicas? Dicas do que?”.
Bem nessa hora Briegel entrou na cozinha.
“Oi filha! Cheguei pro almoço!”, disse Briegel, sorridente, “E pelo visto esse aqui já veio filar a bóia, hein Schultz!”, brincou Briegel ao ver seu amigo. Schultz sorriu com a boca cheia.
“Papai! Pegue um prato!”, disse Alice, convidando Briegel pra se sentar na mesa.
“Almoço em família, muito bom! E você não morre mais, coronel!”, disse Schultz, explicando o que Briegel perdeu na conversa, “Vamos arranjar uma namorada pra você!”.
Briegel tomou um susto, chegou até a se engasgar.
“Namorada?! Tá achando que eu tenho o quê? Quatorze anos? Não tenho mais idade pra isso, Schultz. Melhor desistir logo disso!”, disse Briegel, envergonhado.
“Ah, conta outra, coronel! Todo mundo quer encontrar um parceiro! Não dá pra ficar namorando sua mão a vida inteira, se é que você me entende. Até punheta uma hora cansa. A gente precisa de carne, e eu conheço umas carnes de primeira pra você. Confia em mim, cara! Vou trabalhar de cupido e te arranjar uma facinho!”, disse Schultz.
“Schultz, escuta…”, disse Briegel.
“Papai, por favor, dê uma chance pro tio Schultz”, disse Alice, “Não custa nada, é só conhecer! Pode ser que ela não goste de você, ou você não goste dela, mas não custa nada sair pra um jantar. Pensa bem, o máximo que pode acontecer é dar certo!”.
Os olhos de Alice brilhavam. Não tinha como falar não pra aquela cara dela.
“Tá bom vai. Quando vai ser? Mês que vem esse encontro?”, perguntou Briegel.
“Nada! Quinta-feira! Depois de amanhã! É bom que vá arrumadinho e cheiroso, coronel! Quero ver esse seu charme de cara mais velho em ação!”, disse Schultz.
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14 de setembro de 1933
“Olha ali, coronel. É aquela gatinha que tá sentada naquela mesa tomando vinho!”, disse Schultz ao entrar com coronel no restaurante.
Schultz e Briegel estavam bem chiques. Bem arrumados e cheirosos, como pedia a ocasião. O restaurante escolhido era um bem caro e chique da redondeza. A mulher escolhida por Schultz era bem bonita. Era branca, com um cabelo preto amarrado no topo e olhos grandes e castanhos. Tinha um nariz bem modelado e pernas bem esguias, compridas, todas em um vestido lindo de seda azul claro.
“Só tem uma coisa que me incomoda…”, disse Briegel, “Porque raios a ALICE teve que vir junto?!”.
“Oi, papai! Eu vim torcer, oras! Pode deixar que vou ficar quietinha. Vou fingir que sou companhia do tio Schultz!”, disse Alice, pegando no braço de Schultz.
“Olha só, dei sorte grande! Uma negra maravilhosa dessa jantando comigo, nem parece que sou o tio dela, hahaha!”, disse Schultz, indo até o maitre, “Reserva pra Briegel e Schultz, senhor. Duas mesas”.
“Por aqui, senhores”, disse o maitre.
Ao chegar na mesa Schultz, que estava com Alice fingindo ser sua acompanhante foi até a mesa e apresentou Briegel a mulher do encontro arranjado.
“Flavia?”, disse Schultz. Na hora ela o reconheceu e levantou, “Esse aqui é o meu amigo que queria apresentar”, Schultz apontou pra Briegel, “Ele se chama Roland Briegel e trabalha comigo da SD. Briegel, essa aqui é Flavia Anzanello. Tenham um ótimo jantar! Eu estarei naquela mesa com essa linda dama”, Schultz olhou pra Alice e os dois saíram.
Briegel cumprimentou Flavia e sentou-se depois dela.
“Peço sinceras desculpas pelo jeito do meu amigo”, disse Briegel, “Ele é meio… Exagerado. Mas é uma boa pessoa”.
“Tenho certeza que sim!”, disse Flavia, “Ele fala muito de você. Vocês devem ser mesmo bons amigos! Eu sou italiana, nasci em Veneza. Você é alemão, não?”.
“Ah, sim, sou de Berlim mesmo”, nessa hora o garçom apareceu pra pegar o pedido e Briegel e Flavia fizeram o pedido, e depois voltaram a conversar, “Me desculpa, eu estou meio tímido. Faz muito tempo que não vou a um encontro”.
“Nada, fique tranquilo! Não tente ser quem você não é. Sempre tem alguém que vai gostar do tipo que nós somos realmente. Mas a gente só vai descobrir se a gente mostrar isso pros outros, certo?”, disse Flavia, sorridente.
A mulher realmente parecia saber bem das coisas. Isso impressionou Briegel.
“Uau. Mas eu sou um cara pacato, acho que qualquer mulher me acharia entediante. O Schultz tem todo esse jeitão que toda mulher gosta, bem humorado, gente-fina, brincalhão. Acho que toda mulher preferiria um cara igual a ele do que um cara como eu”, disse Briegel.
“Nem toda mulher”, disse Flavia.
“Acha mesmo? Eu acho que não”, perguntou Briegel.
“Sim. Eu não gosto de homens do jeito do Schultz. Nunca namoraria um cara como ele, exatamente por esse jeito dele, brincalhão. Eu queria um homem sério, um homem responsável, que esteja disposto a um relacionamento sério e duradouro. Não ligo pra dinheiro também, sou perfeitamente dona do meu nariz. Mas não quer dizer que não possa amar ninguém”, disse Flavia.
“Puxa, agora me deixou sem jeito”, disse Briegel, “Realmente você é bem diferente das outras, julguei errado”.
“E você também é bem diferente dos outros”, disse Flavia, sorrindo pra Briegel.
O jantar correu tudo bem e os dois conversavam sobre tudo. Duas garrafas de vinho já haviam sido bebidas, e fazia tempo que Briegel não se divertia tanto conversando em um encontro. Schultz e Alice estavam distante umas três mesas, mas não tiraram o olho de Briegel.
“Ei, tio! Olha só!”, disse Alice, chamando Schultz na sua frente, “Eles vão dançar!”.
“Nossa, essa eu quero ver! Seu pai dança? Não sabia disso!”, disse Schultz.
“Sim! Papai dança muito bem. Mas acho que esse DJ aí tá meio fraco”, disse Alice.
“DJ? Você tá muito ligada nesse palavreado britânico, hein Alice!”, brincou Schultz.
“Hahaha! Eu sou jovem, tio”, disse Alice, brincando com Schultz, piscando com o olho.
Schultz engasgou e deu risada. Alice era uns dois anos apenas mais nova que ele, mas ás vezes parecia uma década. Os dois continuaram observando Briegel e Flavia dançando ao longe.
Briegel e Flavia dançavam bem juntinhos. Parecia que justo naquela noite a banda que normalmente tocava no restaurante não estava lá, e fora substituída por um jovem com um tocador de vinil. Mas as músicas estavam mais mortas que tudo, e até Flavia estava cansada, querendo dançar algo mais empolgante.
“Tio, vou ali falar com aquele moleque que está colocando as músicas. Não é possível, tem que ter umas músicas melhores que essas! Vai acabar ferrando o encontro do papai!”, disse Alice, que foi correndo em direção ao DJ, passando pelas mesas do fundo.
A música estava chegando no fim e Flavia se separou de Briegel. Mas Briegel estava gostando daquilo, por mais que achasse a música ruim também. Num gesto romântico Briegel segurou a mão se Flavia, mesmo ela tentando se separar no salão.
“Espera Flavia, só mais uma música, por favor”, disse Briegel, sorrindo pra ela, enquanto segurava sua mão.
“Tudo bem. É sua última chance!”, disse Flavia, brincando.
Alice Briegel foi discretamente até o garoto que estava com discos e foi por trás dele, chamando-o.
“Ei, garoto!”, disse Alice, numa voz ameaçadora, “Agora vocês todos DJs idiotas que ficam aí se achando, deve ter uma razão pra isso, e nós sabemos o porquê! Ficam aí se achando os superiores agindo de forma legal, mas vocês tem que se ligar que são vocês que agem como uns otários!”, nessa hora Alice pegou um disco vinil que ela conhecia muito bem e entregou a ele, “Toca essa aqui e dá mais vida pra essa festa!”.
O garoto colocou o vinil pra tocar, e rapidamente Briegel reconheceu a música.
“Minha nossa, eu adoro essa música!”, disse Briegel, “Ela é a…”
“My fate is in your hands, da Josephine Baker!”, disse Flavia, com vontade de dançar novamente, “Eu também amo essa música!”.
Essa canção havia sido muito famosa na década de trinta. Briegel não havia assistido ainda, mas quando assistisse o filme “The Vagabond Lover” se lembraria que essa canção que ele dançou com a italiana naquela linda noite. E foi uma dança tão empolgante que com certeza as memórias daquela noite com Flavia pelo resto da sua vida ficariam guardadas no seu coração.
Briegel ainda dançou algumas músicas com Flavia, mas depois fez questão de levar Flavia na sua casa. Schultz levou Alice pra casa dela, e de praxe dormiu no seu amado sofá da sala, enquanto Alice ficou deitada num divã, na frente da lareira, esperando seu pai.
Lá pelas 4h da madrugada Briegel chegou em casa, entrando de mansinho. Viu Schultz jogado no seu sofá, roncando, e quando virou pra subir pro seu quarto viu Alice, vindo do banheiro.
“Papai, chegou?”, disse Alice, com cara de sono, “E aí? Deu tudo certo?”.
“Ah, Alice! Você ficou me esperando, filha? Não precisava”, disse Briegel.
Alice foi até seu pai e o abraçou, dando um beijinho na sua bochecha.
“Não precisa falar nada”, disse Alice, dando um risinho, “Esse perfume sei que não é seu, papai”.
Briegel nessa hora ficou vermelho e deu um beijo na testa da filha. O encontro com Flavia Anzanello durou só aquela noite mesmo. Briegel nunca mais foi atrás dela, e ela menos ainda. Os dois seguiram suas vidas e nunca mais se viram. Mas a felicidade, aquele momento, aquela música e aquela noite ficaram pra sempre na memória de Briegel, guardada com ternura.
“Oi Alice! Que cheiro bom! O que você fez hoje de almoço?”, perguntou Schultz, entrando na cozinha sem anunciar antes.
“Oi tio! Tá com fome? Eu fiz Sauerbraten pro almoço. Deu uma escapada do trabalho?”, perguntou Alice.
“Nossa, por isso tá cheirando tão bem! Sim, eu vim fazer um trabalho aqui perto, aí dei um pulo aqui pra almoçar. Nada como uma comidinha caseira!”, disse Schultz, pegando um prato e se aproximando da porcelana onde Alice colocou pra servir, “Nossa, deixou quanto tempo marinando isso no vinho? Eu tô babando aqui!”.
“Dez dias. Inteirinhos!”, disse Alice, servindo Schultz, “Vamos pra mesa comer. Vai ser ótimo ter sua companhia, tio! Quer cerveja?”.
Schultz estava com a boca cheia, mal conseguia falar.
“Nossa! Você cozinha comida alemã melhor que uma alemã, Alice. Você deve ser loira e usa carvão pra ficar dessa cor, só pode! Você devia abrir um restaurante!”, disse Schultz.
Nessa hora Alice riu.
“Quem sabe depois que Hitler deixar esse governo, pode até rolar! Enquanto ele está no poder vai ser difícil uma negra ter um restaurante, mesmo se for comida alemã”, disse Alice.
“Apenas ‘comida alemã’ não! Comida alemã da melhor qualidade!”, disse Schultz, bebendo um pouco de cerveja pra ajudar a comida descer, “Escuta, Alice, você não tem uma mãe não?”.
“Não”, disse Alice.
“O coronel não tem nem uma namorada?”, perguntou Schultz.
“Ele disse que não tem tempo pra isso. E de fato, ele trabalha muito, todos os dias, sem hora pra chegar. Acho que seria difícil mesmo pra ele entrar num relacionamento assim, tio. Dá pra entender o lado dele”, explicou Alice.
Schultz fez uma cara de quem estava pensando, enquanto mastigava e engolia a comida.
“Olha, tenho uma ideia! Eu conheço muitas gatinhas por aí. Posso tentar apresentar uma pro seu pai! Tenho certeza que vai rolar algo, vou dar umas dicas pra ele!”, disse Schultz, empolgado.
“Dicas? Dicas do que?”.
Bem nessa hora Briegel entrou na cozinha.
“Oi filha! Cheguei pro almoço!”, disse Briegel, sorridente, “E pelo visto esse aqui já veio filar a bóia, hein Schultz!”, brincou Briegel ao ver seu amigo. Schultz sorriu com a boca cheia.
“Papai! Pegue um prato!”, disse Alice, convidando Briegel pra se sentar na mesa.
“Almoço em família, muito bom! E você não morre mais, coronel!”, disse Schultz, explicando o que Briegel perdeu na conversa, “Vamos arranjar uma namorada pra você!”.
Briegel tomou um susto, chegou até a se engasgar.
“Namorada?! Tá achando que eu tenho o quê? Quatorze anos? Não tenho mais idade pra isso, Schultz. Melhor desistir logo disso!”, disse Briegel, envergonhado.
“Ah, conta outra, coronel! Todo mundo quer encontrar um parceiro! Não dá pra ficar namorando sua mão a vida inteira, se é que você me entende. Até punheta uma hora cansa. A gente precisa de carne, e eu conheço umas carnes de primeira pra você. Confia em mim, cara! Vou trabalhar de cupido e te arranjar uma facinho!”, disse Schultz.
“Schultz, escuta…”, disse Briegel.
“Papai, por favor, dê uma chance pro tio Schultz”, disse Alice, “Não custa nada, é só conhecer! Pode ser que ela não goste de você, ou você não goste dela, mas não custa nada sair pra um jantar. Pensa bem, o máximo que pode acontecer é dar certo!”.
Os olhos de Alice brilhavam. Não tinha como falar não pra aquela cara dela.
“Tá bom vai. Quando vai ser? Mês que vem esse encontro?”, perguntou Briegel.
“Nada! Quinta-feira! Depois de amanhã! É bom que vá arrumadinho e cheiroso, coronel! Quero ver esse seu charme de cara mais velho em ação!”, disse Schultz.
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14 de setembro de 1933
“Olha ali, coronel. É aquela gatinha que tá sentada naquela mesa tomando vinho!”, disse Schultz ao entrar com coronel no restaurante.
Schultz e Briegel estavam bem chiques. Bem arrumados e cheirosos, como pedia a ocasião. O restaurante escolhido era um bem caro e chique da redondeza. A mulher escolhida por Schultz era bem bonita. Era branca, com um cabelo preto amarrado no topo e olhos grandes e castanhos. Tinha um nariz bem modelado e pernas bem esguias, compridas, todas em um vestido lindo de seda azul claro.
“Só tem uma coisa que me incomoda…”, disse Briegel, “Porque raios a ALICE teve que vir junto?!”.
“Oi, papai! Eu vim torcer, oras! Pode deixar que vou ficar quietinha. Vou fingir que sou companhia do tio Schultz!”, disse Alice, pegando no braço de Schultz.
“Olha só, dei sorte grande! Uma negra maravilhosa dessa jantando comigo, nem parece que sou o tio dela, hahaha!”, disse Schultz, indo até o maitre, “Reserva pra Briegel e Schultz, senhor. Duas mesas”.
“Por aqui, senhores”, disse o maitre.
Ao chegar na mesa Schultz, que estava com Alice fingindo ser sua acompanhante foi até a mesa e apresentou Briegel a mulher do encontro arranjado.
“Flavia?”, disse Schultz. Na hora ela o reconheceu e levantou, “Esse aqui é o meu amigo que queria apresentar”, Schultz apontou pra Briegel, “Ele se chama Roland Briegel e trabalha comigo da SD. Briegel, essa aqui é Flavia Anzanello. Tenham um ótimo jantar! Eu estarei naquela mesa com essa linda dama”, Schultz olhou pra Alice e os dois saíram.
Briegel cumprimentou Flavia e sentou-se depois dela.
“Peço sinceras desculpas pelo jeito do meu amigo”, disse Briegel, “Ele é meio… Exagerado. Mas é uma boa pessoa”.
“Tenho certeza que sim!”, disse Flavia, “Ele fala muito de você. Vocês devem ser mesmo bons amigos! Eu sou italiana, nasci em Veneza. Você é alemão, não?”.
“Ah, sim, sou de Berlim mesmo”, nessa hora o garçom apareceu pra pegar o pedido e Briegel e Flavia fizeram o pedido, e depois voltaram a conversar, “Me desculpa, eu estou meio tímido. Faz muito tempo que não vou a um encontro”.
“Nada, fique tranquilo! Não tente ser quem você não é. Sempre tem alguém que vai gostar do tipo que nós somos realmente. Mas a gente só vai descobrir se a gente mostrar isso pros outros, certo?”, disse Flavia, sorridente.
A mulher realmente parecia saber bem das coisas. Isso impressionou Briegel.
“Uau. Mas eu sou um cara pacato, acho que qualquer mulher me acharia entediante. O Schultz tem todo esse jeitão que toda mulher gosta, bem humorado, gente-fina, brincalhão. Acho que toda mulher preferiria um cara igual a ele do que um cara como eu”, disse Briegel.
“Nem toda mulher”, disse Flavia.
“Acha mesmo? Eu acho que não”, perguntou Briegel.
“Sim. Eu não gosto de homens do jeito do Schultz. Nunca namoraria um cara como ele, exatamente por esse jeito dele, brincalhão. Eu queria um homem sério, um homem responsável, que esteja disposto a um relacionamento sério e duradouro. Não ligo pra dinheiro também, sou perfeitamente dona do meu nariz. Mas não quer dizer que não possa amar ninguém”, disse Flavia.
“Puxa, agora me deixou sem jeito”, disse Briegel, “Realmente você é bem diferente das outras, julguei errado”.
“E você também é bem diferente dos outros”, disse Flavia, sorrindo pra Briegel.
O jantar correu tudo bem e os dois conversavam sobre tudo. Duas garrafas de vinho já haviam sido bebidas, e fazia tempo que Briegel não se divertia tanto conversando em um encontro. Schultz e Alice estavam distante umas três mesas, mas não tiraram o olho de Briegel.
“Ei, tio! Olha só!”, disse Alice, chamando Schultz na sua frente, “Eles vão dançar!”.
“Nossa, essa eu quero ver! Seu pai dança? Não sabia disso!”, disse Schultz.
“Sim! Papai dança muito bem. Mas acho que esse DJ aí tá meio fraco”, disse Alice.
“DJ? Você tá muito ligada nesse palavreado britânico, hein Alice!”, brincou Schultz.
“Hahaha! Eu sou jovem, tio”, disse Alice, brincando com Schultz, piscando com o olho.
Schultz engasgou e deu risada. Alice era uns dois anos apenas mais nova que ele, mas ás vezes parecia uma década. Os dois continuaram observando Briegel e Flavia dançando ao longe.
Briegel e Flavia dançavam bem juntinhos. Parecia que justo naquela noite a banda que normalmente tocava no restaurante não estava lá, e fora substituída por um jovem com um tocador de vinil. Mas as músicas estavam mais mortas que tudo, e até Flavia estava cansada, querendo dançar algo mais empolgante.
“Tio, vou ali falar com aquele moleque que está colocando as músicas. Não é possível, tem que ter umas músicas melhores que essas! Vai acabar ferrando o encontro do papai!”, disse Alice, que foi correndo em direção ao DJ, passando pelas mesas do fundo.
A música estava chegando no fim e Flavia se separou de Briegel. Mas Briegel estava gostando daquilo, por mais que achasse a música ruim também. Num gesto romântico Briegel segurou a mão se Flavia, mesmo ela tentando se separar no salão.
“Espera Flavia, só mais uma música, por favor”, disse Briegel, sorrindo pra ela, enquanto segurava sua mão.
“Tudo bem. É sua última chance!”, disse Flavia, brincando.
Alice Briegel foi discretamente até o garoto que estava com discos e foi por trás dele, chamando-o.
“Ei, garoto!”, disse Alice, numa voz ameaçadora, “Agora vocês todos DJs idiotas que ficam aí se achando, deve ter uma razão pra isso, e nós sabemos o porquê! Ficam aí se achando os superiores agindo de forma legal, mas vocês tem que se ligar que são vocês que agem como uns otários!”, nessa hora Alice pegou um disco vinil que ela conhecia muito bem e entregou a ele, “Toca essa aqui e dá mais vida pra essa festa!”.
O garoto colocou o vinil pra tocar, e rapidamente Briegel reconheceu a música.
“Minha nossa, eu adoro essa música!”, disse Briegel, “Ela é a…”
“My fate is in your hands, da Josephine Baker!”, disse Flavia, com vontade de dançar novamente, “Eu também amo essa música!”.
Essa canção havia sido muito famosa na década de trinta. Briegel não havia assistido ainda, mas quando assistisse o filme “The Vagabond Lover” se lembraria que essa canção que ele dançou com a italiana naquela linda noite. E foi uma dança tão empolgante que com certeza as memórias daquela noite com Flavia pelo resto da sua vida ficariam guardadas no seu coração.
Briegel ainda dançou algumas músicas com Flavia, mas depois fez questão de levar Flavia na sua casa. Schultz levou Alice pra casa dela, e de praxe dormiu no seu amado sofá da sala, enquanto Alice ficou deitada num divã, na frente da lareira, esperando seu pai.
Lá pelas 4h da madrugada Briegel chegou em casa, entrando de mansinho. Viu Schultz jogado no seu sofá, roncando, e quando virou pra subir pro seu quarto viu Alice, vindo do banheiro.
“Papai, chegou?”, disse Alice, com cara de sono, “E aí? Deu tudo certo?”.
“Ah, Alice! Você ficou me esperando, filha? Não precisava”, disse Briegel.
Alice foi até seu pai e o abraçou, dando um beijinho na sua bochecha.
“Não precisa falar nada”, disse Alice, dando um risinho, “Esse perfume sei que não é seu, papai”.
Briegel nessa hora ficou vermelho e deu um beijo na testa da filha. O encontro com Flavia Anzanello durou só aquela noite mesmo. Briegel nunca mais foi atrás dela, e ela menos ainda. Os dois seguiram suas vidas e nunca mais se viram. Mas a felicidade, aquele momento, aquela música e aquela noite ficaram pra sempre na memória de Briegel, guardada com ternura.
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