Amber #63 - Alice então seguiu o coelho branco, entrando na sua toca.
“Tomas Kovác... Quem diabos é esse?”, disse Alice, vendo os papéis na gaveta.
O que havia dentro da gaveta era de fato o que deveria estar na pasta vazia abandonada no escritório de Briegel. Uma ficha com os dados de um cientista tcheco, chamado Tomas Kovác, um senhor que havia passado dos cinquenta anos, e tinha como residência atual o inferno sobre a terra.
“Varsóvia?”, disse Alice ao ver o papel. Ela engoliu seco, “Mas o exército alemão já chegou até Varsóvia desde que invadiu no começo do mês, não?”, Alice disse tentando confirmar com Liesl.
Liesl estava atônita. Aquilo definitivamente não era nada bom. Embora a objetivo fosse encontrar o cientista, o maior perigo era imaginar o que poderia acontecer com Briegel no meio daquele inferno.
“Eles estão invadindo a Polônia por todos os lados, não me admira que o exército alemão já esteja por lá. Mas que merda... Porque os poloneses fizeram aquele ataque aquela rádio em Gleiwitz? Imagino o quanto pode ser desesperador ver o exército alemão pronto para invadir, mas isso era assinar a própria sentença de morte!”.
“Isso é, se isso for verdade”, disse Alice, tentando raciocinar, “Pensa comigo Liesl, não pode ser coincidência. Infelizmente vivemos num país onde a imprensa não é livre. Talvez nunca saberemos a verdade. Pessoalmente não acredito em nada do que vejo nos jornais”.
Alice tinha razão em duvidar. E sabia que muita coisa que o governo nazista divulgava era sim composto de mentiras para manter o povo fiel ao governo, numa completa alienação. Anos mais tarde, quando a Guerra terminou, a verdade foi revelada: a invasão da Polônia, que iniciou a Segunda Guerra Mundial foi completamente forjada. Oficiais alemães, vestidos com uniforme polonês, tomaram a rádio Gleiwitz, na Polônia, e divulgaram uma mensagem antigermânica em polonês. Ao mesmo tempo forjariam um ataque em um porto alfandegário alemão, para tornar a coisa mais convincente. Para tornar a coisa ainda mais real, assassinaram prisioneiros de campos de concentração, inclusive atirando em seus rostos, para deixa-los desfigurados. O problema era que esses prisioneiros assassinados estavam com uniforme polonês, que foi usado pelo governo nazista para provar que foram atacados por poloneses como pretexto de invadir o país e reivindicar o território perdido na Primeira Guerra Mundial.
“Vamos então para a Polônia”, disse Alice, levando os papéis com os dados de Kovác, “Não podemos perder tempo, temos que partir hoje mesmo”.
Liesl nessa hora ficou assustada.
“Ei, ei, ei!”, disse Liesl pegando no braço de Alice, “Você tá maluca, é? Não lembra do que vimos em Guernica? O exército e aviões estão despejando bombas e tiros em cada centímetro daquele país, destruindo todo e quaisquer resquícios de vida! Isso é maluquice, Alice!”.
“Liesl, eu não acredito que justo você é quem não quer ir!”, disse Alice, com os olhos cheios de lágrimas, “O meu pai desapareceu e provavelmente foi sozinho para aquele lugar! Ele faria a mesma coisa por mim! Ou melhor, ele FEZ a mesma coisa por mim, quando junto do tio Schultz foi até Guernica me salvar!”.
“Alice, por favor, tente entender! Somos duas mulheres, não temos como sobreviver lá! É suicídio!”, disse Liesl, tentando levar um pouco de razão para Alice, “Eu amo demais o coronel, mas ele é homem, sem dúvida ele vai saber se virar, mesmo indo pra lá! Que chances você acha que temos de irmos nós duas sozinhas até aquele inferno?”.
Alice estava profundamente decepcionada com Liesl. Com um movimento brusco soltou a mão de Liesl que segurava seu braço e a encarou, como se estivesse com vergonha dela. Liesl não sabia o que dizer, menos ainda o que fazer. Amava Alice, e também amava o coronel Briegel. Mas aquilo na mente dela não era que elas tinham pouca probabilidade de encontrar Briegel. Na mente dela a probabilidade era igual a zero.
“Liesl, eu te amo, mas nesse momento estou com muita vergonha de você”, disse Alice, num tom totalmente sincero, que tocou diretamente no coração de Liesl, “Eu não sei mais o que falar. Pensei que você me apoiaria, e olha só! Teria sido melhor não ter aberto aquela gaveta então!”, enquanto Alice falava, Liesl apenas olhava pro chão, se arrependendo amargamente pelo que havia acontecido há minutos atrás, “Eu gostaria mesmo que você fosse comigo. Teríamos mais chances! E não dou a mínima por ser mulher, e eu também não sou nenhuma agente super treinada como você. Eu apenas sei o que eu quero e ninguém vai me impedir de ir buscar o meu pai!”, Alice nessa hora, com os olhos completamente marejados foi até a porta. Liesl nessa hora olhou pra ela, e viu que apesar dela estar falando a verdade, em nenhum momento ela disse isso de maneira braba. Era como se Alice estivesse sofrendo internamente uma dor muito maior do que qualquer raiva que ela poderia expressar naquela momento, “Se quiser vir comigo, vamos juntas. Caso contrário, nem que eu tenha que andar cada centímetro da Polônia eu irei, até achar meu pai. Vivo ou morto”.
E Alice deixou então a casa de Briegel onde as duas estavam. Liesl permaneceu por lá, sem conseguir dar uma resposta à sua amiga.
Quinze minutos haviam passado, e Alice estava já empacotando algumas coisas em uma bolsa. Não caberiam muitas roupas, e no meio das dobras era possível ver gotas de lágrimas caindo que ela não conseguia suportar.
“Alice?”.
Ao virar seu rosto viu Liesl, que assim como ela estava chorando muito. Alice apenas balançou a cabeça, a cumprimentando, e Liesl correu até os braços dela e a abraçou, chorando em seu ombro.
“Eu tô com medo, Alice. Tô com muito medo!”, disse Liesl, abraçada com Alice, em prantos, “Eu tenho uma vontade imensa de ir salvar o coronel. Assim como você eu morreria se algo pior acontecesse a ele! Mas ao mesmo tempo sei como o exército nazista é terrível! O que uma garota com sangue judeu e uma negra tem de chances de sobreviver lá? Vamos acabar sendo massacradas!”.
Alice cada vez mais apertava Liesl no seu peito. Ela tinha um coração imenso, um imenso coração materno, capaz de aceitar tudo e a todos. Parecia que quanto mais apertava Liesl, mais parecia de alguma forma ajudar ela a carregar esse fardo. Liesl era sim uma pessoa extremamente madura pra idade dela, mas nesses momentos mostrava que no fundo era apenas uma menina, com medos, sonhos, e muita determinação. Tudo dependia de tirar as dúvidas do caminho que ela tinha na sua frente.
“Eu sei. Eu não sou boba, sabia?”, disse Alice, dando um beijo na testa de Liesl, “Eu também tenho medo. Talvez até mais que você. Mas questione o seu coração, assim como eu questionei o meu, Liesl: O que iria doer mais? Irmos pra batalha e, eventualmente morrermos, mas irmos com uma chance de encontrar o papai, ou ficarmos aqui sem fazer nada apenas aguardando pelo pior?”.
Liesl nessa hora ergueu o rosto, deixando o abraço com Alice, dando um passo para trás. Não parecia que ela queria desistir.
“Vamos juntas então, Alice!”, disse Liesl, sorrindo, no meio dos soluços, “Você tem toda a razão. Não podemos usar a desculpa de sermos mulheres pra ficarmos aqui paradas. Não tô nem aí para o que vai acontecer com a gente, iremos salvar não apenas o coronel, mas também esse tcheco. E ninguém vai nos parar!”.
Alice estava certa em não ter pensado o pior quando Liesl desfez o abraço. Aquele passo para trás que a menina deu significava dois passos para ir em frente, a todo vapor!
O que havia dentro da gaveta era de fato o que deveria estar na pasta vazia abandonada no escritório de Briegel. Uma ficha com os dados de um cientista tcheco, chamado Tomas Kovác, um senhor que havia passado dos cinquenta anos, e tinha como residência atual o inferno sobre a terra.
“Varsóvia?”, disse Alice ao ver o papel. Ela engoliu seco, “Mas o exército alemão já chegou até Varsóvia desde que invadiu no começo do mês, não?”, Alice disse tentando confirmar com Liesl.
Liesl estava atônita. Aquilo definitivamente não era nada bom. Embora a objetivo fosse encontrar o cientista, o maior perigo era imaginar o que poderia acontecer com Briegel no meio daquele inferno.
“Eles estão invadindo a Polônia por todos os lados, não me admira que o exército alemão já esteja por lá. Mas que merda... Porque os poloneses fizeram aquele ataque aquela rádio em Gleiwitz? Imagino o quanto pode ser desesperador ver o exército alemão pronto para invadir, mas isso era assinar a própria sentença de morte!”.
“Isso é, se isso for verdade”, disse Alice, tentando raciocinar, “Pensa comigo Liesl, não pode ser coincidência. Infelizmente vivemos num país onde a imprensa não é livre. Talvez nunca saberemos a verdade. Pessoalmente não acredito em nada do que vejo nos jornais”.
Alice tinha razão em duvidar. E sabia que muita coisa que o governo nazista divulgava era sim composto de mentiras para manter o povo fiel ao governo, numa completa alienação. Anos mais tarde, quando a Guerra terminou, a verdade foi revelada: a invasão da Polônia, que iniciou a Segunda Guerra Mundial foi completamente forjada. Oficiais alemães, vestidos com uniforme polonês, tomaram a rádio Gleiwitz, na Polônia, e divulgaram uma mensagem antigermânica em polonês. Ao mesmo tempo forjariam um ataque em um porto alfandegário alemão, para tornar a coisa mais convincente. Para tornar a coisa ainda mais real, assassinaram prisioneiros de campos de concentração, inclusive atirando em seus rostos, para deixa-los desfigurados. O problema era que esses prisioneiros assassinados estavam com uniforme polonês, que foi usado pelo governo nazista para provar que foram atacados por poloneses como pretexto de invadir o país e reivindicar o território perdido na Primeira Guerra Mundial.
“Vamos então para a Polônia”, disse Alice, levando os papéis com os dados de Kovác, “Não podemos perder tempo, temos que partir hoje mesmo”.
Liesl nessa hora ficou assustada.
“Ei, ei, ei!”, disse Liesl pegando no braço de Alice, “Você tá maluca, é? Não lembra do que vimos em Guernica? O exército e aviões estão despejando bombas e tiros em cada centímetro daquele país, destruindo todo e quaisquer resquícios de vida! Isso é maluquice, Alice!”.
“Liesl, eu não acredito que justo você é quem não quer ir!”, disse Alice, com os olhos cheios de lágrimas, “O meu pai desapareceu e provavelmente foi sozinho para aquele lugar! Ele faria a mesma coisa por mim! Ou melhor, ele FEZ a mesma coisa por mim, quando junto do tio Schultz foi até Guernica me salvar!”.
“Alice, por favor, tente entender! Somos duas mulheres, não temos como sobreviver lá! É suicídio!”, disse Liesl, tentando levar um pouco de razão para Alice, “Eu amo demais o coronel, mas ele é homem, sem dúvida ele vai saber se virar, mesmo indo pra lá! Que chances você acha que temos de irmos nós duas sozinhas até aquele inferno?”.
Alice estava profundamente decepcionada com Liesl. Com um movimento brusco soltou a mão de Liesl que segurava seu braço e a encarou, como se estivesse com vergonha dela. Liesl não sabia o que dizer, menos ainda o que fazer. Amava Alice, e também amava o coronel Briegel. Mas aquilo na mente dela não era que elas tinham pouca probabilidade de encontrar Briegel. Na mente dela a probabilidade era igual a zero.
“Liesl, eu te amo, mas nesse momento estou com muita vergonha de você”, disse Alice, num tom totalmente sincero, que tocou diretamente no coração de Liesl, “Eu não sei mais o que falar. Pensei que você me apoiaria, e olha só! Teria sido melhor não ter aberto aquela gaveta então!”, enquanto Alice falava, Liesl apenas olhava pro chão, se arrependendo amargamente pelo que havia acontecido há minutos atrás, “Eu gostaria mesmo que você fosse comigo. Teríamos mais chances! E não dou a mínima por ser mulher, e eu também não sou nenhuma agente super treinada como você. Eu apenas sei o que eu quero e ninguém vai me impedir de ir buscar o meu pai!”, Alice nessa hora, com os olhos completamente marejados foi até a porta. Liesl nessa hora olhou pra ela, e viu que apesar dela estar falando a verdade, em nenhum momento ela disse isso de maneira braba. Era como se Alice estivesse sofrendo internamente uma dor muito maior do que qualquer raiva que ela poderia expressar naquela momento, “Se quiser vir comigo, vamos juntas. Caso contrário, nem que eu tenha que andar cada centímetro da Polônia eu irei, até achar meu pai. Vivo ou morto”.
E Alice deixou então a casa de Briegel onde as duas estavam. Liesl permaneceu por lá, sem conseguir dar uma resposta à sua amiga.
Quinze minutos haviam passado, e Alice estava já empacotando algumas coisas em uma bolsa. Não caberiam muitas roupas, e no meio das dobras era possível ver gotas de lágrimas caindo que ela não conseguia suportar.
“Alice?”.
Ao virar seu rosto viu Liesl, que assim como ela estava chorando muito. Alice apenas balançou a cabeça, a cumprimentando, e Liesl correu até os braços dela e a abraçou, chorando em seu ombro.
“Eu tô com medo, Alice. Tô com muito medo!”, disse Liesl, abraçada com Alice, em prantos, “Eu tenho uma vontade imensa de ir salvar o coronel. Assim como você eu morreria se algo pior acontecesse a ele! Mas ao mesmo tempo sei como o exército nazista é terrível! O que uma garota com sangue judeu e uma negra tem de chances de sobreviver lá? Vamos acabar sendo massacradas!”.
Alice cada vez mais apertava Liesl no seu peito. Ela tinha um coração imenso, um imenso coração materno, capaz de aceitar tudo e a todos. Parecia que quanto mais apertava Liesl, mais parecia de alguma forma ajudar ela a carregar esse fardo. Liesl era sim uma pessoa extremamente madura pra idade dela, mas nesses momentos mostrava que no fundo era apenas uma menina, com medos, sonhos, e muita determinação. Tudo dependia de tirar as dúvidas do caminho que ela tinha na sua frente.
“Eu sei. Eu não sou boba, sabia?”, disse Alice, dando um beijo na testa de Liesl, “Eu também tenho medo. Talvez até mais que você. Mas questione o seu coração, assim como eu questionei o meu, Liesl: O que iria doer mais? Irmos pra batalha e, eventualmente morrermos, mas irmos com uma chance de encontrar o papai, ou ficarmos aqui sem fazer nada apenas aguardando pelo pior?”.
Liesl nessa hora ergueu o rosto, deixando o abraço com Alice, dando um passo para trás. Não parecia que ela queria desistir.
“Vamos juntas então, Alice!”, disse Liesl, sorrindo, no meio dos soluços, “Você tem toda a razão. Não podemos usar a desculpa de sermos mulheres pra ficarmos aqui paradas. Não tô nem aí para o que vai acontecer com a gente, iremos salvar não apenas o coronel, mas também esse tcheco. E ninguém vai nos parar!”.
Alice estava certa em não ter pensado o pior quando Liesl desfez o abraço. Aquele passo para trás que a menina deu significava dois passos para ir em frente, a todo vapor!
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