E então, finalmente a Covid-19 entrou em casa.

Eu estava vendo em uma reportagem na tevê sobre algo como fases que pessoas passam no meio de uma pandemia. Eu não lembro exatamente, mas falava que no começo era o medo, com todas as incertezas e tal, e depois as pessoas se cansavam e começavam a relaxar nos cuidados. E que essa fase de relaxamento era muito perigosa pois abria a possibilidade de infecção — afinal o vírus não está nem aí se estamos cansados de quarentena ou não.

Na noite da última sexta-feira (22) comecei a sentir muita dor no peito e febre. Não tinha coriza ainda, então achei que poderia ser até dengue (eu vi vários Aedes Aegypti picando minhas pernas). A febre passava dos 38C, então tomei um analgésico pra controlar a febre e dormi. Ontem passei o dia inteiro de cama, e na hora do almoço uma tia disse que fez o exame e deu positivo para Covid.

Eu tive contato com ela, mas acho que a porta de entrada do Sars-Cov-2 foi outra: o meu pai.

Meu pai tem um problema imenso se a rotina dele é quebrada. Acho que talvez ele esteja dentro do espectro autista, não sei. Ele tem o hábito de ir em um filho da puta que vende uns churrasquinhos e bebida pra ele na praça perto de casa, e lá fica falando de futebol, do curintia, e dessas merdas que adicionam nada a porra nenhuma.

Quando a pandemia começou, esse cara do churrasquinho parou (isso foi em março do ano passado). Acho que foi só lá para julho que ele voltou. Não por necessidade, mas porque até ele estava já de saco de cheio de ficar em casa.

Como eu disse antes, meu pai fica irritado quando quebram a rotina dele. E mesmo com o cara do churrasquinho sem abrir a vendinha dele, sempre, pontualmente às 18h, ele abria o portão e ia pensava em ir lá. E durante semanas ele continuava o ritual: abria o portão, mas lembrava que o churrasquinho não estaria lá, e voltava pra dentro.

Porém ele também cansado de ficar trancado em casa, ao ver o churrasquinho de volta, independente da fase que o governo decretasse (as leis não chegam até o Capão Redondo), voltou à rotina. E ia direto toda noite. E expandiu também os horários, passando a frequentar antes do almoço, nos finais de semana e passou até a achar que ir de máscara era uma frescura, que a pandemia já havia passado, enfim.

Meu pai tem um pigarro por conta do cigarro. Eu, que ouço as tosses dele há mais de trinta anos, sei diferenciar. É uma tosse seca, mas não muito comum (entre cinco ou dez vezes por dia). Porém, há umas duas semanas, a tosse começou a ficar bem mais frequente e com catarro. Um som alto e claro. Cheguei a alertar minha mãe: ele tá tossindo mais, isso não é o pigarro dele, e eu tô ouvindo catarro no meio.

Mas né, o Alain é exagerado! Coisa da minha cabeça!

Minha tia propôs um almoço aqui em casa. Vieram minha avó, tias, e meu priminho. Meu pai obviamente se sentou na mesa, e ele não parava de tossir. Diversas vezes eu olhava furioso pra ele, fazendo o gesto de "tape sua boca quando tossir, animal imundo". Mas pra ele era o tal do "pigarro" do cigarro.

Resumo: provavelmente ele pegou Covid, passou pra todo mundo nas suas tosses "inocentes" e agora tô aqui queimando de febre por conta da irresponsabilidade desse filho da puta que não sabia ficar em casa e todo dia ia se expor ao perigo enquanto o trouxa aqui ficava trancado em casa.

Que ódio cara. E hoje perdi o Enem. Com essa febre passarei nem da porta de entrada.

Meu pai tem um talento único pra acabar com meus sonhos. Como eu odeio esse homem.

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