Quanto mais forte a luz, maior a sombra que lhe é projetada.


Como os ideais da direita autoritária entraram na sua família? Todo mundo tem um parente que endossou outros a votarem no atual presidente desse país. Pode ser um tio distante, seu pai ou mãe, ou mesmo você. O fato de um deputado nanico ter chegado até a presidência passa também pelo lado da educação — um povo com pouca educação acha que existe uma maneira simples de resolver problemas complexos — mas entender a origem pode nos fazer sacar o que os levou a apertarem dezessete na urna em 2018.

Na minha família acho que as crianças tiveram papel decisivo para que os adultos conhecessem e votassem nele. Talvez um pouco da estratégia dos jesuítas em catequizar os indígenas: primeiro conquiste as crianças para depois conseguir converter os adultos. Pelo menos na minha funcionou super bem.

Nas eleições últimas eleições para prefeito aqui da capital, vi como vários jovens — muitos longe da idade de poderem participar de uma eleição — vieram me falar sobre o Arthur do Val, que tentou conquistar a cadeira do município. Eu o conhecia da internet, mas era um candidato nanico como tantos outros. Mas eu fiquei impressionado como ele havia conquistado o público jovem, muito pela campanha usando internet e mídias sociais. Muitos que conhecia que moravam bem longe de São Paulo me falavam para votar nele.

Não sei se foi a intenção, mas foi algo muito parecido com o que o atual líder do executivo fez há anos. Eu lembro de muitos parentes meus que eram crianças na época tecendo diversos elogios a ele. Dizendo que só ele era capaz de "mudar tudo o que está aí", e que se pudessem, votariam nele. Crianças que faziam arminha com a mão, e tampouco sabiam o que significado daquele gesto. Não sei se eles se achavam "brancos oprimidos" em tão tenra idade, mas a impressão que dava era um pouco disso no que ouvia nas rodas de conversas.

Só sei que, de tanto crianças falarem, foi conquistando os adultos. E aí foi um pulo para entrarem em redes sociais, grupos de whatsapp, e serem todos massa de manobra do Tonho da Lua (o filho zero dois).

Eu gosto de ver as postagens desses parentes que fazem parte do gado, e vejo o mundo que eles acreditam que vivem. Por um lado eu acho engraçado. Pelo outro, tenho medo deles acharem que é verdade aquilo que dissipam, como esse hentai muito mal feito transformado em propaganda política:


No primeiro parágrafo eu citei em como a educação de um povo pode evitar a eleição de alguém como quem está na chefia do executivo do Brasil. E quando eu dou risada de coisas como acima, penso também no quanto que sou privilegiado em ter tido estudo para saber o quanto de asneira isso é — mas que infelizmente nem todo mundo nesse país teve a mesma chance.

Me lembrei da escola, de quando eu era alvo de bullying por ser nerd. E o quanto foi difícil coisas que para os bagunceiros era muito mais fácil, como ser popular, conseguir o primeiro beijo de uma garota, ou mesmo amigos sinceros (e não os que eram "amigos" apenas para passar cola na prova). O burro da sala, o que não queria estudar, que fazia algazarra e bagunça, era sempre o mais admirado e amado. E muitas vezes o bullying contra o CDF era apoiado pelos outros colegas de turma. O bagunceiro era o valorizado, o que estudava era sempre colocado na mais baixa posição.

Acontece que quando o capitão reformado na chefia do país, que representavam os bagunceiros, era atacado pelos intelectuais, era a reprise daquele ciclo que se repete nas escolas que todo mundo viveu: o que estuda, que questiona, que busca conhecimento é enrolado ou atacado pelo bagunceiro, e o povo — assim como os alunos regulares da turma — achavam o bagunceiro descolado, alguém digno de confiança, só por falar alto e ter esperteza no lugar da inteligência.

E aí o país virou essa grande sala de aula de escola pública, onde os valores são invertidos, quem estuda é chamado de fraco, entediante, feio, que se acha superior; e quem não tem estudo, acha que a Terra é plana, que vacinas causam doenças, que acha que o voto tem que ser impresso, ou que o país está em pleno crescimento, acaba ganhando os corações.

Mas vimos o que acontece quando alguém sem o mínimo de conhecimento consegue fazer quando chega na presidência, certo?

Ao mesmo tempo fica difícil de saber como lutar contra. Hoje existem vários movimentos moldando a sociedade: o feminismo está trazendo igualdade entre os gêneros e ensinando nós homens a sermos melhores, o movimento negro está dando voz e oportunidades para quem sempre foi marginalizado por conta da cor da sua pele, e outros tantos tão importantes quanto movimentos contra crimes de ódio contra asiáticos, a favor da Palestina, ambientalistas, LGBTQIA+ ganhando visibilidade, e tantos outros que não lembro agora estão jogando uma grande luz em cima de nós mesmos, nos fazendo refletir e acolher a diversidade com respeito e direitos iguais.

Mas por outro lado, o supremacismo branco, o neonazismo, o fascismo, a alt-right, reacionários, nacional-populistas, ganham força, como a sombra projetada pela luz dos itens acima.

Isso me lembra da fala da Fada Madrinha da Cinderela no game Kingdom Hearts. É perigoso tentar combater as trevas com mais luz. A sombra projetada vai ser sempre mais forte, e vamos viver nesse imenso dilema sem nunca conseguir evoluir.

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