Livros 2022 #26 - Vamos comprar um poeta (2016)


Um achado fofinho no ano! O lusitano Afonso Cruz nos apresenta um mundo distópico, regido apenas pelo resultado e consumo, onde a arte não existe. E nesse mundo uma família resolve comprar um poeta — como se compra um cachorro na loja — e a chegada desse novo elemento na família, trazendo suas poesias, causa mudanças intensas na vida das pessoas.

Eu amo distopias, e sempre elas têm no mínimo uma nota oito comigo só por reinventarem o mundo. Sei que são até de certa forma clichê, onde pegam uma característica do nosso mundo e as exacerbam, mas eu adoro ver como isso tudo é imaginado e colocado no papel.

Esse livro me faz pensar até mesmo na evolução humana, mesmo ele se passando num futuro distópico. No livro a sociedade é focada apenas no trabalho e consumo. As pessoas não se divertem, ou refletem sobre o mundo, por exemplo. Nesse ponto pensei na nossa própria espécie, especialmente no ponto de inflexão onde deixamos de ser caçadores/coletores para formarmos as primeiras sociedades.

Depois que a necessidade da comida é suprida, o ser humano tinha tempo para pensar em outras coisas. Em olhar para seu entorno, em imaginar, em dar significado para tudo aquilo o que estava ao seu redor. E o resultado de todo esse trabalho mental se deu na arte, onde era capaz de materializar tudo aquilo o que estava na imaginação, e assim compartilhar pensamentos, e acelerar ainda mais nossa evolução. Foi assim que em poucos milhares de anos saímos das cavernas e pisamos na Lua.

E no livro é a mesma coisa! O poeta acaba atingindo cada membro da família de maneira diferente. Em uns escancara a revolta, em outros faz refletir sobre o mundo, e até desperta o sentimento do amor em um deles. Uma obra que nos faz refletir no quão a arte é o alicerce da nossa sociedade, onde sem ela perdemos o sentido da nossa existência, especialmente nos tempos de hoje onde produzir e lucrar é tão imperativo.

Ao final do livro, Afonso Cruz nos presenteia de maneira generosa uma coisa que poucos autores fazem: as referências e inspirações que lhe ajudaram a escrever a obra. Um posfácio interessantíssimo, com conceitos filosóficos de Aristóteles até Locke, que ensina, naqueles poucos parágrafos, um pouquinho de cada um que foi usado no livro, sendo de imenso valor ao despertar-nos o interesse na filosofia e nos fazer querer buscar literaturas além do livro. Sensacional.

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