Eu tenho direito também?


No budismo que eu pratico um dos ensinamentos falam sobre "ser alguém que os outros sintam saudade". Ao nos esforçarmos em sermos pessoas boas, justas, e simpáticas, praticando em prol dos outros, inevitavelmente a pessoa se torna uma boa presença para os outros. Mas e quando isso nos incomoda, e mais e mais pessoas que te adoram ficam fazendo questão de terem sempre você por perto? E quando você precisa de um tempo sozinho, ou apenas está de saco cheio, a gente tem esse direito?

Eu não me considero uma pessoa dessas. Pessoalmente eu me acho uma pessoa muito chata, e eu percebi uma vez o quão impertinente sou quando encontro pessoas que são exatamente iguais a mim. O nosso espelho nos incomoda, pessoas similares a nós acabam sempre causando um estranhamento inevitável pois elas refletem todos os defeitos que não percebemos ter pela nossa óbvia falta de perspectiva.

Mas não vou negar que volta e meia algumas pessoas acabam simpatizando comigo. E isso por um lado é ótimo, pois eu gosto muito de fazer novas amizades. Conversar com pessoas, trocar ideias, aprender com cada um é uma coisa que sempre me atraiu — e isso não tem limites, pode ser jovem, idoso, mulher, brancos, negros, asiáticos, todo mundo mesmo.

No entanto o mundo é cheio de gente que não escuta, que não é sincera, que não está nem aí para ninguém. E por conta desse egoísmo e individualismo que existe na nossa sociedade, por um lado eu entendendo o motivo de muitas pessoas me quererem sempre perto delas: com alguém que ouça, se interesse, se divirta com elas, faz com que a vida seja mais leve. E inevitavelmente querem mais e mais de mim.

Isso sempre me traz um pensamento bastante incômodo sobre o preço de você "ser alguém que os outros sintam falta".

Existem dias que eu não quero encontrar ninguém. Como eu disse acima, existem dias que eu só quero ficar na minha, e contato com pessoas me cansa muito. Mas justamente por eu ser uma pessoa que não sabe dizer não, acabo me forçando a separar um tempo para ficar com essas pessoas que me amam. E eu entendo que essas pessoas que me vêem como alguém especial tem um sentimento muito sincero comigo. Talvez essas pessoas me considerem um dos seus melhores amigos, e querem passar um tempo de qualidade comigo, mas eu sempre me pergunto: será que eu tenho estima por essas pessoas tanto quanto elas têm por mim?

Ter esse tipo de dedicação pode ser uma atitude altruísta. Mas muitas vezes o altruísmo, especialmente para essa imensidão de pessoas em nossa sociedade que tem como o egoísmo e mesquinharia como norte de suas vidas, acaba sendo um lembrete para que a pessoa minimamente pense no próximo de vez em quando — pois a pessoa nunca vai deixar de satisfazer suas necessidades, mas não custa nada dedicar um pouquinho de tempo em prol dos outros.

Mas e quando essa ação de sempre ser um bom amigo começa a trazer essa quase obsessão dos outros, sempre te chamando para visitá-los, para conversar horas no telefone, para sair, e você não sendo capaz de dizer "não" pois não quer? Será que as pessoas estariam prontas para me ouvir dizendo que eu simplesmente não estou afim de encontrá-los, que quero ficar sozinho, e não desmoronar toda a amizade que foi construída?

E esse outro ponto também é algo que me incomoda, sobre o carinho que os outros têm por mim, que eu não consigo dizer se tenho nesse mesmo nível que eles tem por mim, por eles. Entendo que pessoas me vêem como um super amigo, uma pessoa que ouve, que as diverte, que lhes é uma boa companhia, mas o que eu esperaria de um amigo que fosse de encontro com as minhas necessidades?

Acho que um amigo pra mim seria alguém com quem eu conseguiria me abrir. Mas não falo sobre coisas superficiais (embora muitas pessoas achem que as coisas que compartilho com elas seja algo profundo). Não. Eu queria um amigo ou amiga que eu pudesse contar e confiar para coisas muito profundas, como chorar, ficar em silêncio, e essa pessoa estar presente. Talvez uma namorada seria o ideal para isso, eventualmente.

Talvez seja por isso que apesar de eu despertar uma estima grande nos outros, sinto um vazio existencial em um setor da minha vida gigantesco. Que no caso, seria o amoroso. 

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