Educação sexual evita uma car*&%$#@ de coisa ruim.


Eu acho incrível como pessoas evangélicas deixaram de se preocupar com Deus e hoje só se preocupam com a intimidade sexual dos outros. A quantidade de notícias falsas que eu os vejo divulgando por aí não é pouca coisa. Uma última que vi me fez relembrar do quão útil foram as aulas de educação sexual na escola, e me entristece perceber que não apenas as crianças e jovens não estão tendo o mesmo acesso à informação como foi na minha geração, como acessam informações erradas, através da pornografia, por exemplo.

O mais recente ataque que vi foi uma fake news sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais do ensino fundamental, onde os ataques foram direcionados ao último item, sobre orientação sexual.

Um texto muito bem escrito, achei diretrizes sólidas, éticas, e contemporâneas. No PDF disponível nessa mesma página lá está muito bem claro que essa fase da puberdade é uma fase de descobertas, onde brincadeiras e carícias nas próprias áreas íntimas é natural. E que o jovem deve ser orientado que esse tipo de atividade deve ser feito em ambientes íntimos, na sua privacidade, e não na escola. E que, caso aconteça na escola, é pro professor entender que aquilo não é uma aberração, e deixar claro que aquele tipo de espaço público não é para tal coisa. Caso o jovem realize essas ações de forma recorrente, é interessante informar aos pais.

O texto só diz isso. Apenas isso.

Parece bastante sensato, não? Basicamente diz que é natural que o púbere brinque com suas partes íntimas, pois está numa idade ordinária de auto-conhecimento. E que tais ações, como masturbações, devem ser feitas em locais privativos, não em público. E caso o púbere o realize numa escola, por exemplo, o professor deve encarar aquilo como algo normal da idade das descobertas, resolver ali mesmo dentro das regras de conduta da escola, e só avisar aos pais caso o moleque não para de ficar batendo punheta toda hora no banheiro, atrapalhando seus estudos, em bom português.

Mas é doido como tem crentes que distorcem tudo, para ganhar engajamento, já que falar do grande amor divino de Nosso Senhor Jesus Cristo não viraliza. Espalhar o ódio e mentiras é muito melhor, não apenas para eles terem algum tipo de ascensão por meio de views, como também trazer mais usuários e dinheiro para os donos das redes.

A primeira mentira é dizer que o texto diz que "é normal a curiosidade de uma criança em tocar na genitália de outra criança", quando uma pessoa minimamente alfabetizada pode abrir o mesmo documento e ler: "As manifestações mais freqüentes nos ciclos iniciais são a manipulação curiosa dos genitais e as brincadeiras que envolvem contato corporal nas regiões genitais"

Acho que devem ter entendido errado, achado que "brincadeiras que envolvem contato corporal nas regiões genitais" significa que o próprio pré-adolescente toque a si mesmo, e não ele tocar no pinto do amiguinho. E "manipulação curiosa dos genitais" obviamente se refere ao jovem tocar seus próprios genitais. Em nenhum momento a mentira que veiculam está escrita no texto.

A segunda mentira que divulgam é que no final do parágrafo diz que não se justifica informar aos pais sobre o comportamento da criança. Isso de facto está escrito no texto, mas olha o contexto: "Cabe ao educador compreender, então, que não se trata de ABERRAÇÃO que justifique informar os pais sobre tais fatos, devendo a própria escola estabelecer diretamente com seus alunos os LIMITES para o que pode ou não ocorrer dentro dela".

Olha só como nossos educadores estão certíssimos nessa regra. O professor tem que entender que isso é natural da idade, esclarecer que a escola não é lugar para essas intimidades, e não avisar aos pais é ótimo, pois criaria constrangimento do jovem na puberdade. Imagina como ele encararia a adolescência sem consciência do próprio corpo? Poderia ser alvo de abuso sexual, relações sem consentimento, não atrelar sexo com gravidez e ISTs: todos esses casos que arruinariam a vida do mesmo para toda a vida.

O que os difusores de fake news não mostram é a última sentença: "A chamada dos pais só se justifica quando forem práticas muito recorrentes e estejam interferindo nas possibilidades de aprendizagem do aluno".

A distorção é tão grande que eu já vi postagens dizendo que o facto de não avisarem os pais pode acabar escondendo uma situação de abuso. Olha como o negócio vai pra um outro lado que eles dizem que o texto não fala, quando ali perto desse trecho que citam fala exatamente disso, sobre a importância de como o jovem bem informado vai saber identificar, se proteger, e buscar ajuda no caso de um episódio de abuso sexual. Um púbere bem informado, com consciência de seu próprio corpo, está mais prevenido para não cair em situações de abuso do que alguém não informado.

Isso está ESCRITO no documento. É uma orientação enviada para todos os professores desse país! Simplesmente sensacional!

Isso tudo me faz pensar em como a minha geração teve uma sorte que essa molecada não vai ter. Como um habitante da periferia, um local de moral muito conservadora, apesar da pobreza, nunca ouvi dos meus pais "a tal conversa" sobre sexo. Não adianta, cara, é muito difícil para que esses assuntos sejam tratados com normalidade, por motivos óbvios: que vão desde a falta de noção de que seus filhos estão amadurecendo, até o próprio eventual constrangimento.

Se eu passei a adolescência sem engravidar nenhuma menina, e sem pegar nenhuma doença, é porque eu, com meus dez anos, tive aulas de educação sexual na minha sexta série.

Apesar de estudar a vida inteira em escola pública, devo admitir que eu tive muita sorte. Os dois professores de ciências, uma mulher e um homem, separaram a sala entre meninos e meninas para uma aula especial. O professor ficou na sala dos meninos, e a professora na das meninas. E numa conversa descontraída, mas extremamente informativa, conversamos sobre todas as mudanças que estavam acontecendo nos nossos corpos: os pelos aparecendo, a voz engrossando dos meninos, as mamas aumentando nas meninas, as genitálias crescendo, mas também informações úteis sobre o que era sexo, masturbação, e desejo.

E cara, considerando que era uma escola pública, da periferia de São Paulo, vou admitir que para todos os alunos e alunas ali foi um divisor de águas. Ter esse lugar para a gente tirar nossas dúvidas sobre o que estava acontecendo em nossos corpos foi algo tão útil, que eu via que aquela galera que teve essas aulas foram — em grande parte — pessoas muito mais responsáveis em questão de sexo do que as salas que não tiveram essa sorte.

Por exemplo: como eu era um aluno que nunca parou na mesma sala, eu via colegas que não haviam tido essas aulas foram as que engravidaram na adolescência, que transavam sem camisinha se expondo a perigos, e que não tinham a mínima noção de respeito, importunando sexualmente as meninas.

Alguém tem a noção do quanto educação sexual é importante e essencial? Não são aulas sobre "como se fazer sexo". Nenhum professor me ensinou como bater punheta, ou como enfiar meu pinto numa buceta. Isso NÃO se ensina, as pessoas SABEM FAZER ISSO DE MANEIRA INTRÍNSECA. É o instinto, é como comer, beber, dormir. E aqui eu faço também uma crítica a minha época, pois não havia uma orientação caso o jovem fosse LGBTQIA+, num tempo bem mais homofóbico que hoje em dia. Eu não sou gay, mas teria sido muito útil para quem fosse na época.

Portanto, você, da geração z, tente continuar os passos de nós, millennials, quando chegarem a vez de vocês. Infelizmente vivemos em tempos turbulentos, onde precisamos que tais notícias falsas sejam combatidas, pois causam um dano imenso à sociedade. Podem ser igrejas pequenas, mas o conteúdo vai sendo divulgado por redes sociais, e uma mentira acaba tendo um alcance gigantesco. Esses pastores não leram o documento, distorceram completamente para conseguir um maldito engajamento para suas igrejas falidas de garagem e cadeira plástica.

Quando falamos sobre regulamentação na internet é justamente para punir essas empresas que espalham essas notícias falsas por meio de suas plataformas, lucrando em cima do caos que é instaurado.

Ainda tem muita gente canalha no mundo. E essas pessoas não podem ter local de fala. Imagina as pessoas sem instrução que cairão nessa conversa? Elas nem sequer se darão ao trabalho de abrir o documento como eu fiz e ler o que de facto está escrito lá. Vão, levados por suas emoções, apenas divulgar uma mentira. Dá pra imaginar o dano que isso vai causar?

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