Livros 2024 #11 - Todas as suas (im)perfeições (2018)


Quando eu fui pro interior ano passado, uma amiga da minha prima lá de Gavião me indicou um livro. Era da Colleen Hoover, a autora campeã de vendas na Amazon (e, presumo, no mundo), que pessoalmente eu não conhecia. Comprei e deixei parado lá no Kindle, até que resolvi recentemente pegar para ler. São em leituras assim que percebo que esses best sellers são fraquíssimos, e percebo o quão alto é o nível das leituras do clube do livro. Fiquei mal acostumado.

O livro conta a história de Quinn, uma jovem que descobre que seu namorado a está traindo da pior maneira possível: ao subir no apartamento do namorado, ela se surpreende ao ver que lá está outro homem na porta, e esse segundo homem é o namorado da mulher que está na cama com o namorado de Quinn. O outro traído se chama Graham. Quinn termina seu relacionamento, assim como Graham após descobrir o chifre, e logo ambos começam a se envolver e criarem uma história juntos.

Algo que achei interessante foi a construção do livro: ele alterna entre presente e passado, contando a gênese da relação de Quinn e Graham, e o presente, onde ela, por conta de uma endometriose, não consegue ter bebês e sofre muito com isso, pois sempre sonhou ser mãe.

Meu casamento com Graham não é exemplar, mas somos um perfeito exemplo de quando e onde a culpa deve ser atribuída. Ele nunca me faz sentir culpada por ser incapaz de engravidar, e eu jamais quero que se sinta culpado por uma escolha pela qual já se martiriza o bastante.

A autora usa de clichês passados, como o do casal que nunca se comunica, sabe? Pois tudo o que Quinn sofre poderia ser muito bem resolvido com uma conversa franca com Graham. O sofrimento dela por ser infértil é um dos temas centrais do livro, além do distanciamento que ela tem com a própria mãe, que é uma megera de quinta categoria.

É uma escrita bem rasa, embora tenham algumas partes profundas aqui e ali. Um livro fácil e acessível de se ler, dá pra entender o motivo de ter vendido tanto. Mas tirando isso é fraquíssimo.

E antes que alguém venha dizer alguma coisa: eu sei como livros assim são importantes. Acabam, por conta da sua trama simples, sendo ótimas portas de entrada de pessoas para a leitura. E nisso são excelentes, é ótimo que apresentem o mundo da literatura para as pessoas. Mas ao mesmo tempo é bem fraco conforme você vai entrando nesse mundo e lendo coisas melhores. Por isso não gostei, não me pegou, mas pelo menos eu posso dizer que experimentei e conheci.

Mas não leria outros da autora. Sinto muito.

SPOILERS ABAIXO
Depois não diga que eu não avisei.

Essas tramas só se sustentam por conta de serem um poço de coisas melosas. O drama da Quinn cansa muito rápido, a gente fica querendo avançar logo para saber do final, mas tem alguns elementos que ficam no ar, e esses mistérios acabam puxando a gente de volta pra saber o que raio se passa ali, e no que vai dar aquilo tudo.

Outra coisa que detestei é que Graham é um cara muito perfeito. Ele é atencioso, gentil, carinhoso, e mesmo quando ele dá uma mancada, que é trair a Quinn (onde ele diz que foi apenas um beijo numa companheira de trabalho), ele logo consegue arrumar as coisas e continuar firme no casamento. Ele sempre fala a coisa certa no momento certo, e a Quinn sempre fica vendo coisa que não existe, fazendo aqueles dramas intermináveis, achando que o cara não gozou dentro dela porque não a ama mais, disso para pior.

Às vezes ele fala coisas tão doces. Palavras que quero anotar para guardar para sempre e jamais esquecer. Mas nunca as escrevo porque, toda vez que ele diz algo doce, tiro suas roupas e preciso senti-lo dentro de mim mais do que preciso registrar suas palavras.

Talvez a única personagem mais ou menos construída é Ava, a irmã da Quinn. Ela parece ser meio que a irmã sábia, acontecem algumas coisas inesperadas com ela (como engravidar por acidente), e a amizade dela com Quinn é muito bonita. A mãe dela, embora eu também tenha minhas críticas, ela também tem uma conversa franca com a filha e diz que a destratou a vida inteira pois nunca quis ser mãe, nunca estava no planejamento dela, apenas aconteceu.

Então fica naquela coisa, Quinn adoraria ser mãe e fazer diferente da criação que teve, mas é infértil. Já a mãe dela é quem devia ter nascido infértil, pois é a mãe mais cruel e fria de todo o mundo. Outro clichê detectado!

— Nosso casamento não é perfeito. Nenhum casamento é perfeito. Houve momentos em que ela desistiu de nós. Houve ainda mais vezes em que eu desisti de nós. O segredo para nossa longevidade é que jamais desistimos ao mesmo tempo.

As cenas de sexo achei muito bem construídas. Pois ali não está apenas a questão do prazer, mas também a tristeza que Quinn sente de que nada sairá de lá por conta da sua infertilidade. Como o Graham é todo perfeito, eu ficava procurando alguma merda que ele fizesse, lembro de uma parte onde ele não goza dentro da Quinn, e eu pensei que a concepção talvez não acontecia pois o plano dele era justamente fazê-la sofrer achando que ela era infértil. Mas até nisso o cara é "o homem perfeito" e não gozava dentro dela para não fazê-la ter esperanças de que fosse engravidar.

Fala sério, esse Graham é um santo. Demorou pra igreja canonizar ele, enche muito o saco, personagem raso, mal construído, sem falhas de caráter, sem imperfeições.

E o mistério da tal "caixa de madeira" é levada até o final. Ela meio que fica assombrando o livro, sempre que uma crise está muito feia eles falam algo como "vamos abrir a caixa!", e o mundo parece que vai acabar, e sua abertura sempre é postergada. Acontece que ao se casarem Graham deu para Quinn uma caixa onde cada um escreveu uma carta, falando daquele sentimento puro de amor do começo da relação, e essa caixa só seria aberta quando o casal estivesse passando por uma crise onde o divórcio seria eminente.

Não podemos ter filhos, Quinn. E sabe de uma coisa? Por mim, tudo bem. Não casei com você pelos filhos que poderíamos vir a ter um dia. Eu me apaixonei por você e me comprometi com você porque queria passar o resto da vida com você. Era tudo o que me importava quando fiz meus votos. Mas começo a entender que, talvez, você não tenha se casado comigo pelos mesmos motivos.

Mas até nisso o Graham é outro "homem perfeito", e ele guardou cartas extras que escrevia discorrendo sobre momentos que ambos haviam vivido juntos, mostrando que ele sempre acertou, e só errou uma vez: quando achou que havia errado. POIS NUNCA ERROU, MEU DEUS!!

No final eles finalmente têm a conversa, onde ela se abre, diz que sente muito não poder dar um filho pra ele, e todo aquele blá-blá-blá. E ele compreende a situação, e tudo fica bem. A partir de então eles decidem contar mentiras divertidas sempre que as pessoas lhes perguntam se eles tem filhos ou não, pra não ficar a torta de climão por conta da infertilidade da Quinn.

E depois de aceitarem que nunca poderão criar prole, qual o clichê que finaliza o livro?

SIM. ELES ADOTAM UM CACHORRO.

UM
MALDITO
CACHORRO.

Ah, vai se fuder, que livro ruim do caralho.

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