Quando descobrimos que estamos envelhecendo.
Parece que foi ontem que ouvi que eu era geração y. Hoje viramos "millenials". Mas o inevitável aconteceu, e quem vive está vendo. Não somos mais oficialmente a geração mais recente, a geração z está emergindo e francamente eu acho isso muito bom! Já viramos "cringe" e estamos passando o bastão para os próximos que vêm aí. Mas que mundo estamos deixando para essa molecada?
Os novos hábitos não me incomodam, como não tomarem café da manhã, gostarem de calças mais folgadas ou acharem Harry Potter e Friends coisa de velho. Acho que o que incomoda mais os millenials é o fato do tempo ter passado, e não sermos mais a "última novidade". Ainda assim acho super natural que uma nova geração apareça pois essa é a missão dela: trazer coisas novas, diferentes, mesmo que muitas sejam negação da geração anterior. É o ciclo da vida e isso não me incomoda em nada.
Já fizemos isso com nossos pais, da geração x. Meu pai, por exemplo, trabalhou a vida inteira numa firma. Por quase quarenta anos gostava da estabilidade, mesmo que não necessariamente fosse feliz na questão profissional: pois a felicidade era muito mais na segurança de ter sempre o trabalho pelo maior tempo possível do que realização pessoal ou buscar uma vocação.
Esses dois pontos contrastantes são a diferença das duas gerações. Hoje os empregos são muito mais líquidos, pessoas ficam no máximo de dois a cinco anos na mesma empresa. Ou pelo menos ficavam até a crise de 2013 ferrar o país e dar no fundo do poço que estamos hoje. Mas naquele tempo de emprego farto, dólar baixo, e fome zero, era esse o esquema até o atual presidente terminar de ferrar o país.
Nós, millenials, tentamos mostrar uma paixão mais pelo agora. Ter um carro não é objetivo pra todo mundo, afinal existe Uber, e ter um carro é muito gasto e algo muito caro e difícil de vender depois. Se nossos pais, que viveram diversas crises pesadas ali nos anos setenta e oitenta, viveram a década perdida com muita inflação, instabilidade e pobreza, deixaram os sonhos morrerem enquanto pagavam em 48 prestações o Chevette usado ou tentavam pagar até o fim da vida prestações da casa. Não havia mais viagens, era só chegar em casa, dormir e acordar para trabalhar no dia seguinte. Esse era o que era valorizado, esse era o objetivo da geração.
Já os millenials queriam gastar na balada do momento, na viagem para a Europa, compras nos Estados Unidos, ou no capuccino caro (e gostoso) da Kopenhagen. Movimentaram muito a economia, embora não tivessem uma habilidade tão boa em poupar dinheiro como era com as pessoas da geração anterior.
Ao mesmo tempo os millenials acabam adiando ou até riscando a possibilidade de paternidade/maternidade. Muitos culpam anticoncepcionais, ou a independência feminina, mas eu acho que é algo muito mais complexo que isso: o mundo tá uma merda, o meio ambiente tá em perigo iminente, a sociedade é uma confusão, existe muitos humanos no mundo, redes sociais controlam nossas vidas e nos dão ansiedade, e o extremismo está em voga de maneira ainda mais forte do que nos tempos das Grandes Guerras.
Em que mundo que vivemos alguém terá a sanidade de dar a luz a alguém? Grande parte das pessoas da minha idade que conheço que tiveram filhos ou foi por descuido na adolescência, ou são dos poucos que conquistou uma estabilidade financeira, mesmo que mínima, pra sustentar uma família. Sem emprego, sem renda, com um país em frangalhos, parece que vamos deixar pra geração z aumentarem a taxa de natalidade.
Duas coisas me preocupam muito na geração z: o facto deles viverem num mundo de redes sociais, e a individualidade ainda mais forte que em nós, millenials.
Talvez pareça estranho pra alguém com seus quinze, vinte anos de idade quando dissemos que vivemos a transição do analógico pro digital. Havia vida antes do Tiktok, Instagram e Facebook. Víamos tevê direto, ficávamos no telefone, e visitávamos nossos amigos nas casas deles.
Porém hoje embora pareça que ainda existam interações sociais, elas são mediadas por redes sociais. O que era visitar o amigo, hoje virou mandar um direct no Instagram. São locais onde todo mundo posta que está sempre feliz, filtros de foto, vídeos engraçados, ninguém vai se expor e contar suas fraquezas. E são todas máquinas de se fazer dinheiro, seja pro Zuckerberg, pro Larry Page e Sergei Brin, ou pra Vanessa Pappas (CEO do Tiktok), onde seus dados é a riqueza maior. E tudo ali é feito para manipular a pessoa psicologicamente para usar mais e mais, e se viciar naquilo a ponto que passa mal se não abrir e ver as atualizações. Coisas nefastas contadas em documentários como "O dilema das redes" na Netflix.
Viver sendo dependente das redes sociais vai causar um problema grave na aceitação das pessoas. Os jovens da geração z vão se sentir ainda mais solitários e frustrados no mundo do que nós, millenials. E como não há nenhum controle sobre as empresas que gerenciam as redes sociais, teremos uma molecada com graves problemas de ansiedade e baixa estima para que algum filha da puta da Faria Lima tenha o quinto iate em Angra.
E outro ponto que temo na geração z é serem ainda mais individuais do que nós, millenials. Acho que o maior exemplo que posso dar para ilustrar é a mudança nos restaurantes McDonald's: hoje você não vai no balcão e pede o seu lanche. Você vai em um totem touchscreen onde você escolhe o que quer comer, paga ali mesmo e aguarda te chamarem na tela.
Eu tomei um susto e não gosto dessa falta de contato humano. Detestei essa mudança no McDonald's, e ele é apenas um exemplo de tantos outros que seguem a mesma infeliz tendência. Eu gostava de ser recebido por um "bom dia" sorridente da caixa, pagar com dinheiro, agradecer pelo bom atendimento, e ver ali que estão fazendo meu sanduíche do outro lado.
Nessa geração quanto menor contato, melhor. Se for em um hotel, não querem ver a cara do funcionário. Não usam o disk-pizza, compram comida pelo iFood. E se puderem comprar pela internet sem precisar encontrar um vendedor, melhor. Tenho medo dessa individualidade ainda mais forte pois isso reflete em uma enorme timidez que o jovem tem hoje em dia: todos falando baixinho, conversando muito mais pelo celular do que pessoalmente, ligados nas redes sociais, me dá muito medo.
Aprender a falar e se expressar é algo que até a geração millenial era a regra: aprendíamos a fazer apresentações na frente das pessoas, a falar com nossos terapeutas pessoalmente, e perceber o quão rico é se expressar e ver uma outra pessoa do outro lado. Não uma tela, não um celular. Não um texto.
E aí isso também diminui minha taxa de natalidade. Que mundo é esse que nós, millenials, estamos deixando pra geração z, cara?
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